RECURSO ESPECIAL Nº 1.731.214 - AL (2018/0065080-6)
RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : FAZENDA NACIONAL
RECORRIDO : FUND CEAL DE ASSISTENCIA SOCIAL E PREVIDENCIA FACEAL
ADVOGADO : ERISVALDO TENORIO CAVALCANTE E OUTRO(S) - AL009417
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Trata-se de Recurso Especial (art. 105, III, "a", da CF) interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região cuja ementa é a seguinte (fl. 298, e-STJ):
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURIDADE SOCIAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COOPERADOS POR MEIO DE COOPERATIVAS DE TRABALHO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA A CARGO DA EMPRESA TOMADORA DE SERVIÇOS. INCIDÊNCIA DE 15% (QUINZE POR CENTO) SOBRE O VALOR BRUTO DA NOTA FISCAL OU FATURA. ART. 22, IV, DA LEI 8.212/1991, COM REDAÇÃO DA LEI Nº 9.876/1999. INCONSTITUCIONALIDADE. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF SOB REPERCUSSÃO GERAL. RE 595.838/SP. EFEITO REPRISTINATÓRIO DA LC 84/1996. NÃO OCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO DO APELO.
1. O Plenário do STF, quando do julgamento do RE 595.838/SP, em que reconhecida a existência de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade do art. 22, inciso IV, da Lei nº 8.212/1991, com a redação dada pela Lei nº 9.876/1999, firme no entendimento de que ao instituir contribuição previdenciária de 15% incidente sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura, relativamente a serviços prestados por intermédio de cooperativas de trabalho, extrapolou a regra contida no art. 195, I, 'a', da CF/1988. Daí o acerto da sentença que afastou a exação combatida.
2. Ao contrário do afirmado, ao julgar os embargos de declaração manejados em face do acórdão paradigma em comento, não houve reconhecimento da Suprema Corte quanto à ocorrência de efeito repristinatório do art. 1º, da LC nº 84/1996. Em verdade, conforme bem assentou o juízo sumariante, ao incluir o inciso IV ao art. 22, da Lei 8.212/1991, a lei posterior (9.876/1999), não revogou disposição anteriormente existente, mas instituiu nova disposição normativa.
3. A conclusão do magistrado de que será calculado por meio de simples a quo o quantum debeatur cálculos aritméticos não exclui outros meios de liquidação, que será oportunamente objeto de apreciação pelo juízo competente na fase de execução do julgado.
4. Apelação desprovida.
Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fl. 338, e-STJ).
A recorrente, nas razões do Recurso Especial, alega que ocorreu violação dos arts. 17, 489, II, § 1º, IV, e 1022, II, do CPC/2015 e 166 do CTN. Sustenta que houve negativa de prestação jurisdicional. Aponta a ilegitimidade da parte autora para pleitear o indébito tributário. Pugna pelo provimento do recurso para que na liquidação do julgado seja observada a legislação anterior, bem como seja assegurada apenas a compensação com tributos da mesma espécie e após o trânsito e julgado, nos termos dos arts. 26, parágrafo único, da Lei 11.457/2007 e 170-A do CTN.
Contrarrazões apresentadas às fls. 356-368, e-STJ.
Decisão de admissibilidade do recurso à fl. 370, e-STJ.
É o relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.731.214 - AL (2018/0065080-6)
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VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Os autos foram recebidos neste Gabinete em 23.3.2018.
Assiste razão à recorrente, no que toca à alegada violação ao art. 1.022 do CPC/2015.
De fato, apresentou questões jurídicas relevantes, sobretudo quando afirma que a parte autora, ora recorrida, não tem legitimidade para pleitear repetição do indébito. Afirmou (fl. 312, e-STJ):
2. DAS OMISSÕES QUANTO À ILEGITIMIDADE DA AUTORA PARA PLEITEAR REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
A autora ingressou com a presente demanda visando afastar a contribuição previdenciária prevista no art. 22, IV, da Lei 8.212/91 (com a redação dada pela Lei nº 9.876/99), incidente sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços tomados de cooperados por intermédio de suas cooperativas de trabalho e, consequentemente, obter a restituição do que foi pago nos últimos cinco anos.
A pretensão foi acolhida em primeira e segunda instância.
Omitiu-se o v. acordão sobre questão de ordem pública, que pode ser arguida em qualquer momento e grau de jurisdição, bem como deveria ter sido reconhecida de ofício, consubstanciada na ilegitimidade da autora para pleitear a restituição do indébito (arts. 17 do CPC/15 e 166 do CTN).
Com efeito, a autora é tomadora dos serviços prestados pelos cooperados através das cooperativas de trabalho. Assim, recolhe a contribuição do art. 22, IV, da Lei nº 8.212/91 (com a redação da Lei nº 9.876/99), na qualidade de responsável tributário, tendo legitimidade tão somente para discutir a legalidade ou constitucionalidade da exigência, mas não para pleitear em nome próprio a restituição ou compensação do tributo, a não ser que atendidos os ditames do art. 166 do CTN.
Apesar de provocado por meio de Embargos de Declaração, o Tribunal a quo não apreciou a questão. Neste contexto, diante da referida omissão, se apresenta violado o art. 1.022 do CPC/2015, o que impõe a anulação do acórdão que julgou os Embargos Declaratórios, com devolução do feito ao órgão prolator da decisão para a realização de nova análise dos Embargos.
Nesse sentido, confiram-se:
RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. OCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. In casu, a parte recorrente alega na petição dos aclaratórios que "houve sim prova do pagamento das competências referidas", bem como que "o HISCRE está juntado no final do documento CALC2 no evento 1 do processo originário de embargos à execução"(fls. 221, e-STJ).
2. Instada a se manifestar, verifica-se que não houve a análise pela Corte local da questão suscitada pela parte recorrente, o que configura matéria relevante ao deslinde da controvérsia.
3. Recurso Especial provido para determinar o retorno dos autos à Corte de origem para novo julgamento dos Embargos de Declaração.
(REsp 1640656/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2017, DJe 06/03/2017)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL. FUNGIBILIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL. ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO. OMISSÃO EXISTENTE. SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA. QUESTÃO RELEVANTE. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM.
1. Os princípios da fungibilidade recursal e da economia processual autorizam o recebimento de embargos de declaração como agravo regimental.
2. Caracteriza-se ofensa ao art. 535 do CPC quando a Corte de origem deixa de se pronunciar a respeito de questões essenciais ao julgamento da lide, as quais poderiam, em tese, levar a resultado diverso.
3. Agravo regimental não provido (EDcl no AgRg no REsp n. 1.561.073/AL, Rel. Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 18/04/2016).
Sabe-se que a ausência de legitimidade ativa, por se tratar de uma das condições da ação, é matéria de ordem pública cognoscível a qualquer tempo e grau, sendo insuscetível de preclusão nas instâncias ordinárias.
Nesse sentido, confiram-se:
A ausência de legitimidade ativa, por se tratar de uma das condições da ação, é matéria de ordem pública cognoscível a qualquer tempo e grau de jurisdição, sendo insuscetível de preclusão nas instâncias ordinárias (AgInt no AREsp 571.007/SC, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe 04/11/2016).
A ausência de legitimidade ativa, por se tratar de uma das condições da ação, é matéria de ordem pública cognoscível a qualquer tempo e grau, sendo insuscetível de preclusão nas instâncias ordinárias (AgRg nos EDcl no AREsp 604.385/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/03/2016, DJe 07/03/2016).
A legitimidade das partes é questão de ordem pública, e, portanto, pode ser apreciada a qualquer tempo pelas instâncias ordinárias (AgRg no REsp 1311367/MG, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2014, DJe 24/06/2014).
Dessarte, o vício poderia ter sido corrigido, mesmo de ofício, na segunda instância recursal.
Diante do exposto, dou provimento ao Recurso Especial para determinar o retorno dos autos à Corte de origem para novo julgamento dos Embargos de Declaração.
É como voto.