Inteiro teor - REsp 1633391

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.633.391 - MG (2011/0073394-5) RELATOR : MINISTRO LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO) RECORRENTE : MARIA JOSÉ BELO - ESPÓLIO REPR. POR : IVAN CÉSAR DA SILVEIRA - INVENTARIANTE ADVOGADO : HELCIO BARBOSA CAMBRAIA JUNIOR E OUTRO(S) - MG057171 RECORRIDO : HIDROLUX EMPREENDIMENTOS GERAIS LTDA ADVOGADO : UBIRAJARA VIEIRA FRANCO E OUTRO(S) - MG081975 RELATÓRIO EXMO. SR. MINISTRO LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO) - Relator: Os autos dão conta de que, na origem, HIDROLUX EMPREENDIMENTOS GERAIS LTDA ajuizou ação monitória contra o ESPÓLIO DE MARIA JOSÉ BELO visando à expedição de mandado de pagamento no valor de R$ 293.611,53, nos termos do apurado em laudo pericial homologado em procedimento cautelar de produção antecipada de provas destinado à apuração dos "danos ocorridos no imóvel de propriedade da Autora, danos estes até a presente data ainda não liquidados, incluídos nestes todo período de fruição em que as chaves do referido imóvel permaneceram em poder da Ré" (fl. 7). O requerido opôs embargos alegando a existência de coisa julgada, inexistência de documento hábil à propositura da ação e a oportuna entrega das chaves do imóvel à autora (fls. 498/509). Os embargos foram julgados improcedentes, condenando-se o Espólio ao pagamento do valor apresentado na inicial (fls. 595/599). A sentença foi mantida pelo eg. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que negou provimento à apelação do requerido nos termos do acórdão assim ementado: "AÇÃO MONITÓRIA. OFENSA À COISA JULGADA NÃO COMPROVADA. PROVA ESCRITA. LAUDO PERICIAL. POSSIBILIDADE. Não se produz coisa julgada material sobre as sentenças homologatórias, podendo ser analisadas as questões que escaparam da transação celebrada entre as partes. Por documento escrito deve-se entender qualquer documento que seja merecedor de fé quanto à sua autenticidade e eficácia probatória. O laudo pericial é autêntico, pois elaborado por perito oficial e comprova os valores devidos, podendo, assim, embasar a monitória." (fl. 723) Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 757/762). Inconformado, o ESPÓLIO DE MARIA JOSÉ BELO interpôs recurso especial com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional (fls. 765/789), apontando divergência jurisprudencial e violação aos seguintes dispositivos legais: a) art. 535 do CPC/1973, porquanto não supridas as omissões e contradições arguidas em embargos de declaração; b) arts. 295, V, e 1.102-A do CPC/1973, ante a inexistência de documento hábil à propositura da ação monitória, uma vez que o laudo pericial obtido em procedimento preparatório de produção antecipada de prova não constitui prova escrita de dívida, apenas constata a existência de "danos no imóvel em questão sem apontar, contudo, o agente causador dos mesmos e a suposta culpa do recorrente" (fl. 775); c) art. 269, III, do CPC/1973, uma vez que a ação monitória repete o objeto de ação de conhecimento anteriormente ajuizada pela recorrida, a respeito da qual as partes realizaram transação homologada em juízo, ensejando ofensa à coisa julgada; e d) art. 940 do CC/2002, porque a recorrida, tendo ciência do depósito das chaves em juízo e da consequente desocupação do imóvel, demanda por dívida que sabe inexistente, caracterizando a sua má-fé. Foram apresentadas contrarrazões (fls. 803/817). É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.633.391 - MG (2011/0073394-5) VOTO EXMO. SR. MINISTRO LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO) - Relator: 1. O recurso será examinado à luz do Enunciado n. 2 do Plenário do STJ, nos seguintes termos: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça." Inicialmente, não se conhece da alegada ofensa ao art. 535 do CPC/1973, porquanto a fundamentação do recurso mostra-se deficiente, uma vez que baseada em alegações genéricas, sem a exata demonstração dos pontos alegadamente omissos e contraditórios existentes no acórdão recorrido. Portanto, incide, na hipótese, o óbice da Súmula 284/STF. O recurso também não prospera quanto à apontada violação dos arts. 269, III, do CPC/1973 e 940 do CC/2002. Com efeito, quanto às alegações de coisa julgada e de cobrança de dívida já paga, foram expressamente afastadas pelo Tribunal a quo à base da seguinte fundamentação: "No caso em tela, a sentença homologatória da transação somente faz coisa julgada das matérias decididas no termo e, sendo assim, é perfeitamente possível o ajuizamento da presente ação monitória, pois as questões não abordadas na transação são passíveis de discussão. [...] No tocante à preliminar de coisa julgada, verifico que havendo uma transação homologada em juízo, os limites da transação devem ser observados e, no caso em tela, a questão não foi objeto do acordo celebrado entre as partes, motivo pelo qual não há falar em coisa julgada, que material, quer formal. [...] Não e verifica nos autos qualquer procedimento temerário por parte da apelada. Aliás, ela veio a juízo para receber quantia que sabidamente lhe é devida, não havendo qualquer indício de litigância de má-fé. [...] Não há nos autos qualquer comprovação de valores pagos à apelada, razão pela qual não há falar em repetição em dobro." (fls. 728/729 e 731/732). Nesse contexto, a modificação do julgado quanto aos referidos pontos demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7 do STJ. 2. A questão aqui controvertida, portanto, cinge-se a verificar a possibilidade de se reconhecer em laudo pericial de vistoria de imóvel, obtido em procedimento cautelar preparatório de produção antecipada de prova, documento suficiente à propositura de uma ação monitória. Conforme relatado, a recorrida, HIDROLUX EMPREENDIMENTOS GERAIS LTDA, ajuizou ação monitória contra o recorrente, ESPÓLIO DE MARIA JOSÉ BELO, visando à expedição de mandado de pagamento no valor de R$ 293.611,53. O pedido foi instruído com base em laudo pericial homologado em procedimento cautelar de produção antecipada de provas que, segundo apontado na inicial, destinou-se à apuração dos "danos ocorridos no imóvel de propriedade da Autora, danos estes até a presente data ainda não liquidados, incluídos nestes todo período de fruição em que as chaves do referido imóvel permaneceram em poder da Ré" (fl. 7). Nos embargos, o embargante arguiu, entre outras defesas, a inexistência de documento hábil à propositura da demanda. O il. Magistrado de piso julgou improcedentes os embargos, tendo afastado a preliminar de inexistência de prova escrita da dívida nos seguintes termos: "Alega ainda a contestação que inexiste prova escrita da dívida do espólio. Com base nisso, requer o indeferimento da petição inicial. O presente processo traz pedido de pagamento de fruição por ocupação de bem cujo valor foi apurado em laudo técnico. A falecida manteve-se na posse de imóvel valioso que segundo o laudo pericial e suas fotos, apodreceu aos pés do desrespeito a coisa alheia. Existe uma pretensão de cobrança de valor específico declarado pericialmente como correto, decorrente de ato da responsabilidade incidente sobre o patrimônio do espólio sucessor do de cujus. Não se fala aqui em aluguel, mas em pagamento de quanto devido. Desta forma, não há qualquer dúvida na procedência da cobrança." (fls. 598/599) O Tribunal Estadual, por sua vez, manteve a sentença de improcedência dos embargos e reafirmou validade do laudo pericial como documento hábil à propositura da ação monitória, tendo decidido à base da seguinte fundamentação: "O espólio sustenta que não há documento hábil à propositura da presente ação monitória, pois o laudo pericial não poderia embasar esse procedimento. Sem razão. Para manejo da ação monitória, nos termos do art. 1102-A do Código de Processo Civil, o credor deverá apresentar documento escrito sem eficácia de titulo executivo. NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY lecionam que "Por documento escrito deve-se entender qualquer documento que seja merecedor de fé quanto à sua autenticidade e eficácia probatória. (..) O documento escrito pode originar-se do próprio devedor ou de terceiro."' (Código de Processo Civil Comentado. 9 ed. Revista dos Tribunais. 2006). O laudo pericial acostado aos autos é autêntico, posto ter sido realizado por perito oficial e comprova os valores devidos pelo espólio, sendo suficiente para embasar a presente ação. Saliente-se, por fim, que o procedimento cautelar de produção antecipada de provas não visa acautelar um procedimento ordinário, apenas. Aliás, o art. 796 do Código de Processo Civil menciona a expressão "processo principal", nele estando compreendidos, também, os procedimentos especiais, não tendo a lei feito distinção. Por essas razões, a preliminar merece ser rejeitada." (fls. 729/730). O recorrente, no entanto, sustenta a inexistência de documento hábil à propositura da ação monitória, uma vez que o laudo pericial obtido em procedimento preparatório de produção antecipada de prova não constitui prova escrita de dívida, apenas constata a existência de "danos no imóvel em questão sem apontar, contudo, o agente causador dos mesmos e a suposta culpa do recorrente" (fl. 775). Quanto ao ponto, penso que lhe assiste razão. Dispõe o art. 1.102-A do Código de Processo Civil de 1973: Art. 1.102-A. A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Conforme ressalta HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "para que seja válida a opção pela ação monitória, terão, outrossim, de ser observados requisitos ou condições em três planos, ou seja, quanto ao objeto da obrigação, aos seus sujeitos e à prova da relação obrigacional" (Curso de Direito Processual Civil - Procedimentos especiais, Vol. III - Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 333 - grifo acrescido). Com efeito, a ação monitória é procedimento de cognição sumária que tem por objetivo abreviar a formação de título executivo judicial e agilizar a prestação jurisdicional, porém facultado apenas a quem possua prova escrita do débito, documento este que, não obstante desprovido de força executiva, demonstre a existência de relação jurídica entre as partes e da obrigação alegada. Efetivamente, a teor do art. 1.102-A, a ação monitória deve ser instruída com prova escrita do direito alegado. A prova escrita, como esclarece HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "tanto é a pré-constituída (instrumento elaborado no ato da realização do negócio jurídico para registro da declaração de vontade) como a casual (escrito surgido sem a intenção direta de documento o negócio jurídico, mas que é suficiente para demonstrar sua existência)" (Ob. cit., pp. 338, grifos acrescidos). Não se exige que o documento escrito emane do próprio obrigado. Exige-se, no entanto, que tenha "valor probante, revelando o conhecimento plausível da obrigação" (REsp 244.491/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJ de 13/8/2001 - grifos acrescidos). Nesse mesmo sentido: "RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. PROVA ESCRITA. JUÍZO DE PROBABILIDADE. CORRESPONDÊNCIA ELETRÔNICA. E-MAIL. DOCUMENTO HÁBIL A COMPROVAR A RELAÇÃO CONTRATUAL E A EXISTÊNCIA DE DÍVIDA. 1. A prova hábil a instruir a ação monitória, isto é, apta a ensejar a determinação da expedição do mandado monitório - a que alude os artigos 1.102-A do CPC/1.973 e 700 do CPC/2.015 -, precisa demonstrar a existência da obrigação, devendo o documento ser escrito e suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado acerca do direito alegado, não sendo necessário prova robusta, estreme de dúvida, mas sim documento idôneo que permita juízo de probabilidade do direito afirmado pelo autor. 2. O correio eletrônico (e-mail) pode fundamentar a pretensão monitória, desde que o juízo se convença da verossimilhança das alegações e da idoneidade das declarações, possibilitando ao réu impugnar-lhe pela via processual adequada. 3. O exame sobre a validade, ou não, da correspondência eletrônica (e-mail) deverá ser aferida no caso concreto, juntamente com os demais elementos de prova trazidos pela parte autora. 4. Recurso especial não provido." (REsp 1.381.603/MS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 11/11/2016). No caso dos autos, vê-se que a recorrida intentou a ação monitória com base em laudo pericial obtido em ação cautelar de produção antecipada de prova destinada à apuração dos danos ocorridos no imóvel de sua propriedade, que, afirma, teriam sido causados durante sua ocupação por MARIA JOSÉ BELO, já falecida. A questão que se coloca, nesses termos, é saber se o referido laudo constitui ou não prova escrita da relação obrigacional afirmada pelo autor, hábil ao ajuizamento da ação monitória a que se refere o art. 1.102 do CPC. A teor da sentença, a monitória, a partir do laudo pericial que lhe serve de base, abarca a seguinte pretensão: "O laudo pericial de engenharia vem homologado e acompanhado de prova pericial e registros fotográficos. No que tange a este laudo, evidenciou-se que existe uma conta pendente para recompor o estado do imóvel em R$ 10.690,00, uma conta referente a taxas de condomínio no valor de R$ 13 .788,67, até março de 2008; um débito de IPTU até março de 2008 de R$ 4.694,59 no que chega a uma conta de R$ 32.471,76, aplicável a partir do juro moratório de 1 % ao mês. O autor ainda diz que recebeu as chaves do imóvel apenas em julho de 2008 conforme fl. 334v daquele procedimento devendo ser acrescentado os pagamentos de IPTU dos meses de abril, maio, junho e julho de 2008 em um total de R$ 322,69; taxas condominiais do mesmo período em um valor total de R$ 5.310,00 e, portanto, chegando a um total de R$ 33.324,45. Destaca que o imóvel se encontra ocupado a partir de março de 1992 e que a autora só recebeu as suas chaves em julho de 2008, sendo certo que nesses mais de dezesseis anos não houve qualquer pagamento a título de fruição ou aluguel, tendo a autora arcado com as despesas acessórias do veículo naquilo que chamou de enriquecimento sem causa, uma vez que o imóvel ficou a disposição da de cujus sem qualquer contraprestação financeira, no que autora requereu o pagamento da importância mensal de R$ 1.180,00 a título de fruição, referente à responsabilidade civil da de cujus pelo lucro cessante decorrente da indisponibilidade do imóvel a seu efetivo proprietário. Computado o período de março de 1992 até março de 1998, o autor chegou ao número de 226.560,00 que, segundo o autor que alega ter recebido as chaves em julho de 2008, sofreu um acréscimo de R$ 4.130,00 perfazendo um total de R$ 230.690,00 que acrescidos aos valores primievos referentes à reforma, taxas e condomínio chegam a um total de R$ 264.014,45 como a importância pretendida pelar autora. Desta forma, a expedição do mandado de pagamento desta importância, acrescida de 10% a título de honorários advocatícios em um total de R$ 293.6 11,53." (fls. 596/597). Conforme se verifica, há, no referido laudo, referência aos danos verificados no imóvel vistoriado, assim como o levantamento de outras despesas não quitadas, relativas ao mesmo bem. Entretanto, para que se possa extrair desses dados a convicção da existência de uma relação de obrigação entre as partes, atribuindo-se à falecida, agora substituída por seu espólio, a responsabilidade pela reparação dos danos alegados, faz-se necessária, por óbvio, a complementação dessa prova. Com efeito, um laudo pericial, por si só, não se mostra suficiente à demonstração do vínculo obrigacional, visto que apenas estabelece o quantum debeatur, ou seja, a extensão do dano, não se mostrando apto à definição do an debeatur, isto é, o direito à indenização. Especificamente no caso dos autos, segundo o que se verifica nas alegações e inúmeros documentos juntados ao processo, é patente a enorme contenda entre as partes em torno no imóvel em questão. Do que consta do processo, vê-se que a posse inicial do imóvel de propriedade da autora, pela falecida, deu-se de forma legítima, em razão de contrato de promessa de compra e venda. Após a realização do negócio, contudo, inúmeras ações foram ajuizadas por ambas as partes, tornando litigiosa a relação negocial. Há nos autos, de um lado, notícia de que a falecida obteve a rescisão do contrato de compra e venda, bem como a devolução dos valores pagos (fls. 243/246); de outro, que a autora teria intentando "uma ação de ressarcimento por danos em imóvel", julgada improcedente (fls. 148/150). Consta, ainda, a celebração de transação posterior, pondo fim às ações em curso (fls. 547/550). Veja-se, inclusive, que a questão relativa à ação de ressarcimento anteriormente ajuizada pela autora foi submetida a esta eg. Corte, tendo sido objeto do Ag 633.586/MG, da relatoria do em. Ministro Castro Filho, que não conheceu do recurso especial interposto contra o seguinte acórdão do mesmo Tribunal de Justiça: "INDENIZAÇÃO - OCUPAÇÃO DE IMÓVEL - COMPRA E VENDA - RESCISÃO POR CULPA DA VENDEDORA - POSSE JUSTA DA COMPRADORA ATÉ DEVOLUÇÃO DO PREÇO PAGO - RESSARCIMENTO PELA OCUPAÇÃO INDEVIDO. Quando a rescisão do contrato de compra e venda se dá por culpa da vendedora, improcede o pedido de ressarcimento pela ocupação do imóvel, fundada no contrato rescindido, até que seja devolvido à compradora, o preço que pagou." Diante disso, ainda que não se possa cogitar a existência de coisa julgada, expressamente afastada pelo Tribunal a quo, é forçoso reconhecer que, no caso, o alegado direito à indenização da autora (an debeatur) revela-se incerto. Efetivamente, o reconhecimento do direito alegado dependeria, por exemplo, da prova da ocupação do imóvel pelo tempo alegado - o que o recorrente contesta, apontando o depósito judicial das chaves (fl. 232) -, ou que a ocupação, em havendo, seria ilegítima. Esse quadro, contudo, inviabiliza a ação monitória. Na lição de HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "A prova a cargo do autor tem de evidenciar, por si só, a liquidez, certeza e exigibilidade da obrigação, porque o mandado de pagamento a ser expedido liminarmente tem de individualizar a prestação reclamada pelo autor e não haverá oportunidade para o credor completar a comprovação do crédito e seu respectivo objeto. Além disso, o mandado de pagamento só pode apoiar-se em obrigação cuja existência não reclame acertamento ulterior e cuja atualidade já esteja adequadamente comprovada" (Ob. cit., p. 340, grifos acrescidos). De fato, conforme já assentado por este Tribunal, em se tratando de ação monitória, a prova escrita deve ser suficiente em si mesma, não sendo hábil à propositura da ação o mero começo de prova. Confira-se: "AÇÃO MONITÓRIA. ORDEM DE SERVIÇO PARA CONSERTO DE VEÍCULO. MERO COMEÇO DE PROVA ESCRITA E NÃO PROVA ESCRITA, COMO EXIGE O ART. 1.102A DO CPC. INTEMPESTIVIDADE DOS EMBARGOS OPOSTOS. - Não cabe ao STJ dirimir controvérsia sobre a interpretação da lei local que define determinados dias do mês de janeiro como sendo feriados. Súmula nº 280-STF. - Para viabilizar a ação monitória, a prova escrita deve ser suficiente em si mesma, não sendo hábil a tal fim o mero começo de prova escrita. Necessidade de demonstração pelo autor, por intermédio de prova testemunhal complementar, ao menos da autorização dos serviços pelo proprietário do veículo. Recurso especial não conhecido." (REsp 180.515/SP, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, QUARTA TURMA, DJ de 12/4/1999). Não se diga que, no caso, a prova deveria ficar a cargo do demandado, uma vez que compete ao autor o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 333, I, do CPC/1973. Na lição do Professor HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "Quanto ao ônus da prova, a ação monitória não apresenta novidade alguma. Prevalecem as regras do art. 333 do Código de Processo Civil, ou seja, ao autor comete provar o fato constitutivo de seu dereito e ao réu incumbe a prova do fato impeditivo, modificativo ou extintivo daquele direito" (Ob. cit., p. 340). Nesse sentido: "AÇÃO MONITÓRIA ? CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE ? EMBARGOS À MONITÓRIA ? ENCARGOS ILEGAIS ? ÔNUS DA PROVA ? PROVA PERICIAL ? HONORÁRIOS DO PERITO. I ? O contrato de abertura de crédito rotativo, acompanhado da planilha de cálculo e dos extratos de conta-corrente, constitui prova suficiente para o ajuizamento da ação monitória (Súmula n.º 247/STJ). II ? Demonstrado pelo autor da monitória, pelos documentos apresentados com a inicial, o fato constitutivo de seu direito, compete ao embargante provar os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito do autor, nos termos do artigo 333, incisos I e II, do Código de Processo Civil. III ? Se o réu insiste na realização de perícia técnica, com o escopo de comprovar as alegações feitas em seus embargos, é dele o dever de antecipar os honorários do perito. Recurso especial provido." (REsp 337.522/MG, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, DJ de 19/12/2003) Portanto, é forçoso reconhecer que o laudo pericial apresentado pela autora-recorrida, ao contrário do entendimento esposado pelo eg. Tribunal de origem, não constitui prova escrita suficiente à propositura da ação, estando caracterizada, assim, a violação do art. 1.102-A do Código de Processo Civil de 1973. 3. Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar procedentes os embargos. É como voto.