Inteiro teor - REsp 729924

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RECURSO ESPECIAL Nº 729.924 - RS (2005/0030406-3) RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Por PEDRO LAIR KUHN e outros foi proposta reclamação trabalhista em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL buscando seu reenquadramento no cargo de Escriturário a contar da data de ingresso naquela instituição por concurso público para a vaga de Auxiliar de Escritório e, a partir de 01.01.85, no cargo de Escriturário Nível "A" ou "B", a depender do tempo de serviço de cada um. A ação é julgada parcialmente procedente (fls. 1244/1249). Inconformadas, as partes ingressam com recurso ordinário perante a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sendo desprovido o manejado pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e, parcialmente provido, o interposto pelos empregados, em acórdão que guarda a seguinte ementa: "RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. CEF. CORREÇÃO DE ENQUADRAMENTO INICIAL. PRESCRIÇÃO. ATO ÚNICO DO EMPREGADOR. DIFERENÇAS SALARIAIS POR DESVIO DE FUNÇÃO. PROMOÇÕES. CORREÇÃO MONETÁRIA. TAXA REFERENCIAL DIÁRIA - TRD E TR. LEI 8.177/91 E LEI 8.660/93. O enquadramento funcional é ato único do empregador. Transcorrido o lapso bienal entre o ato de enquadramento funcional e o ajuizamento da ação, prescrito está o pedido e não apenas as parcelas de trato sucessivo, visto que se trata de prescrição do fundo de direito. Assim, confirma-se a prescrição do fundo de direito em relação aos reclamantes admitidos há mais de dois anos antes do ajuizamento da ação. No caso de reclamantes admitidos antes do transcurso do biênio legal, se foram contratados como auxiliares de escritório, mas exerceram as funções de escriturário, fazem jus à correção do seu enquadramento inicial no cargo de Escriturário, desde a admissão. A existência de quadro de carreira vincula o empregador. O quadro é apenas óbice para a ação de equiparação salarial e não para a correção de enquadramento, reenquadramento, reclassificação, promoção, etc. Na jurisprudência, a matéria se pacificou através do Enunciado 127 do TST: "Quadro de pessoal organizado em carreira, aprovado pelo órgão competente, excluída a hipótese de equiparação salarial, não obsta reclamação fundada em preterição, enquadramento ou reclassificação." Descabem as progressões funcionais se os reclamantes não trazem para os autos as normas que regulam a movimentação dos empregados no quadro de carreira, pois a falta de prova obsta o exame da pretensão. Em relação aos reclamantes cujas pretensões à correção de enquadramento funcional foram consideradas prescritas, não impede o reconhecimento do direito às diferenças salariais por desvio de função, na forma da Súmula nº 223 do extinto TFR: "O empregado durante o desvio de funcional tem direito à diferença salarial ainda que o empregador possua quadro de pessoal organizado em carreira". Não se confundem correção de enquadramento funcional e diferenças salariais decorrentes de desvio de função. Essas figuras têm identidade distinta e fundamentos próprios. A correção de enquadramento se funda no parágrafo 2º do art. 461 da CLT (os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos critérios de antigüidade e merecimento). O desvio de função, no art. 460 da CLT (na falta de estipulação do salário ou não havendo prova sobre a importância ajustada, o empregado terá direito a perceber salário igual ao daquele que, na mesma empresa, fizer serviço equivalente, ou do que for habitualmente pago para serviço semelhante). Entendo que o desvio de função implica - analogicamente - na falta de estipulação do salário no tocante à função para a qual o empregado foi desviado, sendo aplicável por analogia a citada regra. É aplicável na correção monetária dos débitos trabalhistas a TRD instituída no art. 39, § 1º, da Lei nº 8.177/91 e a TR, a partir da lei 8.660/93, que extinguiu a TRD. Recurso ordinário da CEF desprovido e recurso ordinário dos reclamantes provido em parte." (fls. 1325/1326) Opostos embargos de declaração pelos reclamantes, restaram acolhidos, mas sem efeitos modificativos. No recurso especial a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, com base nas letras "a" e "c" do permissivo constitucional, sustenta malferimento aos arts. 11, 460 e 461 da CLT e dissídio jurisprudencial. Assinala, no essencial, estar prescrita a pretensão relativa às diferenças salariais em decorrência do desvio de função, pois já transcorridos mais de dois anos entre a admissão de grande parte dos recorridos e o ajuizamento da ação. Assevera que garantir o direito ao pagamento de diferenças salariais é o mesmo que reconhecer o enquadramento sob outra denominação. Não fosse isso, afirma não comprovados os requisitos necessários à obtenção de equiparação salarial, sem falar que os empregados indicados como parâmetro não se prestam ao fim colimado, pois ostentam tempo de serviço superior a dois anos. De todo modo, a existência de quadro de pessoal organizado em carreira impede a equiparação pretendida, nos termos do art. 461, § 2º, da CLT. Contra-razões às fls. 1417/1434. É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 729.924 - RS (2005/0030406-3) VOTO O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (RELATOR): Pelo aresto recorrido foi reconhecida a prescrição do pleito de reenquadramento para os autores admitidos pela CEF há mais de dois anos da propositura da ação, aproximadamente 150 pessoas, sendo-lhes, porém, deferida a pretensão ao recebimento de diferenças salariais em razão do desvio de função, com termo inicial fixado em setembro de 1984. Afirma a Caixa Econômica, porém, estar prescrito não somente o direito ao reenquadramento, como também às diferenças salariais, pois ambos decorrem de ato único do empregador, consumado há mais de dois anos da propositura da ação. É de se ver, porém, que a lesão decorrente do não pagamento das diferenças salariais em face do desvio de função se renova mês a mês, períodos em que o termo inicial da prescrição se reinicia. Nesse contexto, somente estão prescritas as diferenças salariais anteriores ao biênio que precede o ajuizamento da ação. Nesse sentido: "Enquadramento. Desvio de função. Diferenças salariais. Súmula nº 223 do extinto Tribunal Federal de Recursos. Prescrição. Precedentes da Corte. 1. A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que, no caso dos autos, a prescrição só alcança as prestações anteriores a dois anos do ajuizamento da ação e no sentido de que o empregado que está em desvio de função tem direito a receber as diferenças, ainda que não tenha direito ao enquadramento. Precedentes anteriores em outra direção não prevalecem, presente a Súmula nº 83 da Corte. 2. Recursos especiais não conhecidos." (REsp 213.549/RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, Terceira Turma, julgado em 14.12.1999, DJ 08.03.2000 p. 109) "TRABALHISTA - SERVIDORES DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - DESVIO FUNCIONAL - ENQUADRAMENTO - SÚMULA N. 233/TFR - DIFERENÇA SALARIAL - PRESCRIÇÃO. I - SE A LESÃO AOS DIREITOS É DE NATUREZA PERMANENTE, RENOVANDO-SE MENSALMENTE, A PRESCRIÇÃO SÓ ALCANÇA AS DIFERENÇAS SALARIAIS ANTERIORES AO BIÊNIO QUE PRECEDEU O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. II - RESTANDO COMPROVADA A IDENTIDADE DE ATRIBUIÇÕES EXERCIDAS PELOS AUXILIARES DE ESCRITÓRIO E PELOS ESCRITURÁRIOS, TEM APLICAÇÃO AO CASO A SÚMULA N. 223, DO EXTINTO TFR. III - REGIMENTAL IMPROVIDO." (AgRg no Ag 27.528/SP, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Terceira Turma, julgado em 10.10.1994, DJ 14.11.1994 p. 30952) De outra parte, o Tribunal de origem reconhece, em face da prova pericial produzida, que pelos ocupantes dos cargos de auxiliar de escritório eram exercidas as mesmas funções dos escriturários, conforme se depreende do seguinte trecho do aresto recorrido, que no particular acolhe os termos da sentença de primeiro grau, verbis: "O desvio de função ocorre comumente quando o detentor de um cargo com menor número de atribuições, exerce funções de um cargo com atribuições mais complexas. O laudo pericial de fl. 1151, afirma que formalmente existem diferenças entre os extintos cargos de Auxiliar de Escritório e Escriturário, porém na prática os ocupantes dos dois cargos exerciam funções idênticas. A reclamada não produziu qualquer prova que infirme esta afirmação pericial." (fls. 1322) Nesse contexto, mudar referido entendimento demanda incursão no conjunto fático-probatório dos autos, providência que encontra óbice na súmula 07/STJ. Cumpre ressaltar, ainda, que a questão relativa ao tempo de serviço dos empregados utilizados como parâmetro para o pagamento das diferenças salariais não foi objeto de decisão por parte do Tribunal de origem, ressentindo-se o recurso especial, no pertinente, do indispensável prequestionamento. Incide, na espécie, as súmulas 282 e 356/STF. Esclareço, por outro lado, que a existência de quadro de pessoal organizado em carreira não implica na impossibilidade do pagamento de diferenças salariais em decorrência do desvio de função (súmula 223 TFR), conforme iterativa jurisprudência desta Corte, retratada nas seguintes ementas: "TRABALHISTA. CEF. Desvio de função. Tratamento igualitário. Prescrição. julgamento "extra petita". - Inexiste ofensa aos arts. 128 e 460 do CPC no acórdão que atende ao segundo pedido sucessivamente formulado pelos autores (art. 289 da CLT). - A prescrição da ação de cobrança das diferenças salariais decorrentes do desvio de função só atinge as prestações anteriores a dois anos do ajuizamento da ação. - O empregado que está em desvio de função tem direito à diferença salarial, ainda que não o tenha ao enquadramento. recurso não conhecido." (REsp 182.276/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Quarta Turma, julgado em 03.11.1998, DJ 01.03.1999 p. 336) "TRABALHISTA - SERVIDORES DA CAIXA ECONOMICA FEDERAL - DESVIO FUNCIONAL - ENQUADRAMENTO - SUM. 233/TFR - DIFERENÇA SALARIAL - PRESCRIÇÃO. I - SE A LESÃO AOS DIREITOS E DE NATUREZA PERMANENTE, RENOVANDO-SE MENSALMENTE, A PRESCRIÇÃO SÓ ALCANÇA AS DIFERENÇAS SALARIAIS ANTERIORES AO BIÊNIO QUE PRECEDEU O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. II - RESTANDO COMPROVADA A IDENTIDADE DE ATRIBUIÇÕES EXERCIDAS PELOS AUXILIARES DE ESCRITÓRIO E PELOS ESCRITURÁRIOS, TEM APLICAÇÃO AO CASO A SUM. 223, DO EXTINTO TFR. III - SE O EMPREGADOR POSSUI QUADRO DE PESSOAL ORGANIZADO EM CARREIRA, O DESVIO FUNCIONAL NÃO CONFERE DIREITO A REENQUADRAMENTO OU RECLASSIFICAÇÃO, ASSEGURANDO-SE TÃO-SÓ A PERCEPÇÃO DE DIFERENÇA. IV - RECURSO NÃO CONHECIDO." (REsp 128.995/PR, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, Terceira Turma, julgado em 04.12.1997, DJ 30.03.1998 p. 45) "TRABALHISTA. QUADRO DE CARREIRA. DIFERENÇA SALARIAL. SE O EMPREGADOR POSSUI QUADRO DE PESSOAL ORGANIZADO EM CARREIRA, O DESVIO FUNCIONAL NÃO CONFERE DIREITO A REENQUADRAMENTO OU RECLASSIFICAÇÃO, ASSEGURANDO-SE TÃO-SÓ A PERCEPÇÃO DE DIFERENÇA SALARIAL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO." (REsp 40.070/SP, Rel. Min. CLÁUDIO SANTOS, Rel. p/ Acórdão MIN. COSTA LEITE, Terceira Turma, julgado em 11.09.1995, DJ 10.03.1997 p. 5963) Por fim, o dissenso deve ser comprovado por certidão, cópia autenticada ou citação do repositório de jurisprudência oficial ou credenciado, em que publicada a decisão divergente, com indicação da respectiva fonte, providência a que se furtou a recorrente. Não conheço do recurso especial.