Inteiro teor - REsp 1532544

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.532.544 - RJ (2013/0208370-6) RECORRENTE : MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO PROCURADOR : JOSÉ MARCOS VIEIRA RODRIGUES FILHO E OUTRO(S) - RJ163083 RECORRIDO : FRANCISCO DE SANTIAGO DANTAS BARBOSA QUENTAL RECORRIDO : FELIPPE DE SAN TIAGO DANTAS BARBOSA QUENTAL RECORRIDO : LUCIA DE SAN TIAGO DANTAS BARBOSA QUENTAL RECORRIDO : INES QUENTAL FERREIRA RECORRIDO : VIOLETA DE SAN TIAGO DANTAS BARBOSA QUENTAL RECORRIDO : JOAO LUIZ DE SAN TIAGO DANTAS BARBOSA QUENTAL RECORRIDO : ISABEL DE ARAUJO QUENTAL RECORRIDO : JOAO GUILHERME SANDERS QUENTAL RECORRIDO : RAFFAELLA DE FILIPPIS QUENTAL RECORRIDO : REGINA MARIA SANDERS QUENTAL RECORRIDO : ALEX KLEIN RECORRIDO : ANNA VICTORIA LEMANN OSORIO RECORRIDO : PAULO ALBERTO LEMANN RECORRIDO : JORGE FELIPE LEMANN RECORRIDO : MARCILIO MARQUES MOREIRA ADVOGADOS : MIGUEL PACHÁ E OUTRO(S) - RJ133874 MICHEL PACHÁ JUNIOR - RJ121168 RELATÓRIO O SR. MINISTRO MINISTRO MARCO BUZZI: Cuida-se de recurso especial interposto por MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, fundado no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e ?c? do permissivo constitucional, desafiando acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro. Depreende-se dos autos que o município recorrente interpôs agravo de instrumento contra decisão interlocutória, proferida nos autos do Inventário Judicial, pela qual se interpretou o testamento deixado por EDMÉA DE SAN TIAGO DANTAS, concluindo, em conformidade com a vontade da testadora e com os atuais princípios hermenêuticos, não ser razoável inferir que o legado destinado à irmã pré-morta fosse concedido à municipalidade a título de herança jacente, determinado, ao final, o acréscimo de referido percentual às quotas-parte dos sobrinhos herdeiros (e-STJ, fl. 436). No procedimento de inventário deflagrado pelo respectivo testamenteiro, o Município ora recorrente ingressou no feito a pedido do Ministério Público, consoante manifestação de fl. 358 (e-STJ) e decisão de intimação para integrar a lide de fl. 367 (e-STJ); sendo que, nas razões do agravo de instrumento (e-STJ, fls. 5-22), o aludido ente público municipal sustentou que as cláusulas testamentárias tinham sido redigidas de forma clara, técnica e direta e, portanto, desnecessária qualquer outra interpretação além da literal, para que lhe fosse transferido o patrimônio de Edméa em razão do seu óbito. Asseverou, ainda, que a falecida cuidou de regulamentar expressamente o direito de acrescer na cláusula contemplativa dos sobrinhos de seu marido, ora recorridos, permanecendo silente quanto à referida reversão na disposição atinente à sua irmã. O insurgente defendeu que a conclusão alcançada pela instância de origem configuraria verdadeira inovação testamentária, porquanto faria inserir regra nova no testamento a benefício dos recorridos. Aduziu, ainda, ofensa aos arts. 1.788, 1.829 e 1.844 do Código Civil, asseverando que a morte prévia da irmã da testadora, sem a existência de cláusula de reversão do quinhão a ela atribuído e diante da ausência de herdeiros necessários, levaria à inevitável conclusão de que o testamento caducou nesta parte, devendo tal parcela do patrimônio ser arrecadada como herança jacente. As contrarrazões (e-STJ, fls. 450-467), por sua vez, sustentaram que a decisão de primeira instância encontra respaldo na doutrina nacional. Avocando as relações afetivas recíprocas com sua falecida tia, os recorridos defenderam a clareza das disposições testamentárias em estabelecer que a última vontade da testadora era de instituí-los herdeiros, como entendem que de fato o fez, sem descuidar de sua irmã, morta na abertura da sucessão, mas viva à época da feitura do instrumento, não almejando sua instituidora, em tempo algum, destinar parte de seu patrimônio à Fazenda Municipal. Os recorridos discorreram sobre a aplicação do art. 1.889 do Código Civil à espécie, salientaram que a cláusula testamentária dispõe de forma límpida sobre o direito dos sobrinhos de substituir a irmã pré-morta ao utilizar-se da expressão ?que deixa o restante de seus bens, em partes iguais, a seus sobrinhos?. Com vista dos autos, o Ministério Público Federal salientou que os recorridos não são parentes da falecida, nem mesmo por afinidade, consoante dicção do art. 1.595 do Código Civil, mas que, diante do fato da morte da irmã da testadora ter ocorrido quando essa já estava interditada, sem condições, portanto, de alterar seu testamento, a decisão de origem, que aplicou os princípios hermenêuticos insculpidos nos arts. 112 e 1.899 do Código Civil, a fim de perquirir a real intenção da testadora e afastar a pretensão do município recorrente, deveria ser mantida (e-STJ, fls. 470-473). O Tribunal de origem, por sua vez, mantendo a decisão atacada, reiterou a prevalência da vontade última do testador, afirmou que, no presente caso, essa vontade era de dispor de todos os bens em favor de seus familiares e não para o município, conforme corrobora a carta do testamenteiro Marcílio Marques de Moreira. O acórdão recebeu a seguinte ementa (e-STJ, fl. 476): 1) Agravo de Instrumento. Inventário. Testamento. Morte da legatária antes da testadora. Caducidade. Pretensão do Município, rejeitada, de ver decretada herança jacente referente ao quinhão da legatária pré-morta, pelo fato da caducidade do testamento, sem que o testador tenha deixado herdeiros necessários e não existir direito de acrescer entre os colegatários. Arts. 1788, 1939-V e 1944, par. único, do Código Civil. - 2) Pedido subsidiário de remeter os litigantes às vias ordinárias rejeitado. Ausência das situações elencadas no art. 984, do Cód. Proc. Civil, ou seja, não estamos diante de questão que demanda alta indagação nem que dependa de outras provas. - 3) Interpretação do testamento que não deve ser apenas literal, olvidando-se da efetiva e última vontade da testadora, a qual, efetivamente, era dispor de todos os seus bens em favor dos familiares, irmã e sobrinhos, ressalvadas as obras de arte destinadas ao MAM. - 4) Registre-se, ademais, que o falecimento da irmã legatária se deu quando a testadora já estava interditada, sequer tendo a oportunidade de adequar seu último ato de vontade à nova situação. - 5) Inexistência de herança, jacente, fazendo-se valer a real vontade daquela que testou. -6) Decisão mantida. Recurso desprovido. Nas razões do especial (e-STJ, fls. 483-505), o Município recorrente aponta, além de dissídio jurisprudencial, violação dos artigos 1.829, 1.844, 1.899, 1.947, 1.788, 1.906, 1.944, caput e parágrafo único, 1.939, V do Código Civil, afirmando, em síntese, a suficiência da interpretação literal do testamento que, por ter sido escrito de forma clara, técnica e direta, exteriorizou a intenção da testadora sem mácula ou obscuridade, de modo que dispensável qualquer outra técnica interpretativa. A Municipalidade irresigna-se contra a compreensão adotada na decisão recorrida, porque violadora das disposições testamentárias, já que criou regra atinente ao direito de acrescer que não estava escrita. Para tanto, salienta que a falecida cuidou de regulamentar expressamente o direito de acrescer na cláusula contemplativa dos sobrinhos de seu marido, ora recorridos, permanecendo silente quanto à referida reversão na disposição atinente à sua irmã. Assim, argumenta "o Código Civil é claro ao prever, no art. 1.947, a possibilidade do testamento abrigar a substituição de herdeiros, para que uma ou algumas pessoas sejam beneficiadas diante da renúncia ou impossibilidade de aceitação pelo herdeiro originalmente nomeado. No entanto, tal previsão, como já foi dito acima, deve ser expressamente aposta pelo testador, o que afasta a possibilidade de se instituir uma substituição por simples presunção". (e-STJ, fl. 493). Aduz, por fim, que, "existe expressa previsão em lei (art. 1.788, art. 1939, V, art. 1.944 do CC/02), no sentido de que quinhões da herança não contemplados no testamento ou contemplados em disposições de última vontade que caducaram seguem as regras da sucessão legitima" (e-STJ, fl. 500). De modo que, ante à inexistência de previsão de substitutos à quota da irmã pré-morta e de outros herdeiros necessários, a parcela do patrimônio deve ser arrecadada como jacente. Por último, suscitou dissídio jurisprudencial, com o julgamento proferido no REsp n. 147.959/SP, quanto à interpretação a ser dada às disposições testamentárias na hipótese de ausência de herdeiro legal e pré-morte do testamentário. Contrarrazões ofertadas às fls. 525-543 (e-STJ) pela inadmissibilidade do especial, ante a incidência dos óbices das Súmulas 5 e 7 desta Corte e, no tocante ao dissídio apontado, a falta de similitude fática entre as demandas. No mérito, reitera que a interpretação dada pela Corte de origem privilegia a real vontade da testadora, isto é, que no caso da pré-morte da irmã, todo o restante caberia aos sobrinhos. O juízo de admissibilidade deu-se mediante à interposição de agravo (e-STJ, fls. 555-562), com apresentação de contraminuta às fls. 566-577 (e-STJ). Com vista dos autos, o representante do Ministério Público Federal manifestou-se pelo não provimento do agravo (e-STJ, fls. 586-590), face à aplicação do óbice da Súmula 83/STJ, pois a decisão de origem, ao privilegiar a interpretação que melhor assegurasse a observância da vontade do testador, decidiu em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça . Por força da decisão de fl. 583 (e-STJ), foi dado provimento ao agravo para convertê-lo em recurso especial para melhor análise da controvérsia. É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.532.544 - RJ (2013/0208370-6) EMENTA RECURSO ESPECIAL ? PROCEDIMENTO DE INVENTÁRIO ? TESTAMENTO PÚBLICO ? HERDEIRA PRÉ-MORTA ? QUOTA-PARTE ? CONVERSÃO EM HERANÇA JACENTE ? IMPOSSIBILIDADE ? INTERPRETAÇÃO DO TESTAMENTO ? PRINCÍPIO DA SOBERANIA DA VONTADE DO TESTADOR ? APLICABILIDADE - RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. INSURGÊNCIA DO MUNICÍPIO. Hipótese: A quaestio iuris a ser enfrentada diz respeito à determinação do método interpretativo adequado para as disposições testamentárias controversas, em atenção ao princípio da soberania da vontade do testador, disposto no art. 1.899 do Código Civil. 1. Na existência de cláusula testamentária duvidosa, que remete a interpretações distintas, deve-se compreendê-la de modo que melhor se harmonize com a vontade manifestada pelo testador, em atenção ao princípio da soberania da vontade desse, insculpido nos artigos 112 e 1.899 do Código Civil. 2. Quanto à aplicação do princípio da soberania da vontade do testador na interpretação dos testamentos pode-se determinar as seguintes premissas : a) naquelas hipóteses em que o texto escrito ensejar várias interpretações, deverá prevalecer a que melhor assegure a observância da vontade do testador; b) na busca pela real vontade do testador, deve ser adotada a solução que confira maior eficácia e utilidade à cláusula escrita; c) para poder aferir a real vontade do testador, torna-se necessário apreciar o conjunto das disposições testamentárias, e não determinada cláusula que, isoladamente, ofereça dúvida; e d) a interpretação buscada deve ser pesquisada no próprio testamento, isto é, a solução deve emergir do próprio texto do instrumento. 3. O instituto da herança jacente foi desenvolvido para proteger o patrimônio do de cujus de eventuais abusos de terceiros, destinando-o à coletividade, na pessoa do Estado. Em assim sendo, a mens legis que orienta o instituto é de considerá-lo como a ultima ratio, isto é, considerar a ocorrência da jacência em última análise quando, de nenhuma outra forma, for possível atribuir a herança a quem de direito. 4. Na presente hipótese, a interpretação teleológica do testamento de acordo com a real vontade do testador, em observância dos artigos 112 e 1.899 do Código Civil, conduz à conclusão de que a testadora objetivamente desejava que todo seu patrimônio, à exceção das duas obras legadas ao MAM/RJ, fosse repartido entre sua irmã e os sobrinhos de seu marido e que, em consequência, a previsão de substituição recíproca escrita na parte final da disposição testamentária viesse à abranger à irmã pré-morta, sem que houvesse modificação no texto das últimas vontades. 5. Dessa forma, em razão da interpretação conjunta das disposições testamentárias combinada com a aplicação do princípio da soberania da vontade do testador associada às peculiaridades do caso concreto, em que a testadora foi interditada após a feitura do testamento, de modo que ficou inviabilizada qualquer alteração deste a fim de adequar-se à nova situação fática, conclui-se pela inexistência de herança jacente na hipótese, devendo a quota-parte da herdeira pré-morta reverter ao demais herdeiros testamentários 6. Não houve demonstração de dissídio jurisprudencial, diante da ausência de similitude fática entre os acórdãos, de maneira que inviável o inconformismo apontado pela alínea c do permissivo constitucional. 7. Recurso especial desprovido. VOTO MINISTRO MARCO BUZZI (Relator): O recurso não merece prosperar. 1. Primeiramente, cabe destacar que a quaestio iuris a ser enfrentada diz respeito à determinação do método interpretativo adequado para as disposições testamentárias controversas, em atenção ao princípio da soberania da vontade do testador, disposto no art. 1.899 do Código Civil. 2. Assim, para melhor exame da controvérsia, faz-se prudente explicitar o delineamento fático e probatório traçado pelas instâncias ordinárias no tocante às declarações testamentárias, com observância da vontade da testadora. Para tanto, destaca-se os seguintes trechos da decisão recorrida (e-STJ, fl. 432-434): 1. A inventariada deixou testamento e o testamenteiro apresentou o respectivo esboço de partilha às fls. 733/764. 2. A testadora não possuía herdeiros necessários e legou, excluídas as obras de arte deixadas ao MAM/RJ, 25% do seu patrimônio à sua irmã e o restante de seus bens a seus sobrinhos, filhos de João e Dulce. 3. Ocorre que a irmã que seria beneficiada é pré-morta à testadora, sendo caduco, então, o legado, retornando tais bens para o próprio monte. O MP, às fls. 766, apresentou a sua cota explicitando o seu entendimento a respeito da partilha de todo o monte componente da herança, requerendo o MP que o inventariante e o testamenteiro se manifestassem para esclarecer quanto ao parentesco dos beneficiários do testamento em relação à testadora (art. 1839, CC/2002). 5. Às fls. 769/774, manifestaram-se o testamenteiro e os demais interessados anotando que a interpretação que estaria sendo dada ao inventário não respeitaria a última vontade da testadora, que, em nenhum momento, explicitou desejo de que, se sua irmã gêmea fosse pré-morta, 25% do patrimônio ficassem como "herança jacente". Ao contrário, o desejo da testadora, como posto nos itens 25 e 26 de fls. 773, seria que tais valores voltassem àqueles já beneficiados e não que tal quinhão fosse para a municipalidade, forte nos artigos 112 e 1899, do CC/2002. 6. Às fls. 821/822, veio nova manifestação do MP entendendo que o 1/4 legado à irmã pré-morta seria realmente herança jacente, com os argumentos ali expendidos, requerendo a intimação do Município do Rio de Janeiro. 7. Despachei às fls. 822 determinando a intimação do Município do Rio de Janeiro e, importante registrar, aqui revogo a primeira parte da minha decisão que acolhia a cota do MP. 8. Às fls. 824/828, nova manifestação do testamenteiro e dos interessados no sentido de que não há que se falar em herança jacente, pois a testadora tinha como vontade que todo o seu patrimônio, excluídas as obras de arte discriminadas no testamento, fosse dividido entre os demais legatários, como ressaltado no item 14 de fls. 828. 9. Às fls. 838/840, juntou-se carta do próprio testamenteiro Marcílio Marques Moreira expressando que a vontade de Edméa era deixar todos os seus bens para o conjunto dos seus sobrinhos, caso sua irmã fosse pré- morta, que foi o que ocorreu. Veja-se, a seguir, o seguinte trecho da carta do testamenteiro às fls. 839, penúltimo parágrafo: "Conhecendo bem a testadora, não me parece crível nem razoável que ela, sem outros herdeiros legítimos, quisesse deixar seus bens ao Município do Rio de Janeiro ou a qualquer outra entidade fora da família. Quando quis fazê-lo, como no caso do legado do MAM, ela o fez explicitamente e especificamente, nomeando a instituição e os bens correspondentes. Não haveria de fazer diferentemente, e através de uma tecnicalidade jurídica, no caso do Município. Nunca tive dúvida de que, no caso do falecimento de sua irmã antes do seu, D. Edméa entendia que, com a exceção das duas obras de arte destinados ao MAM, todos os bens restantes reverteriam para o conjunto dos sobrinhos do casal." E do acórdão (e-STJ, fl. 480): Ademais, cabe acrescentar, porque deveras importante, que quando do falecimento da irmã Edmée, ocorrido em 11/02/2008 (fls. 302), a testadora estava interditada (fls. 303), daí que sequer teve a oportunidade de adequar seu último ato de vontade à nova situação, isto que, por certo o faria, a fim de contemplar os seus sobrinhos com a parte que havia legado à irmã falecida. A partir dos excertos acima transcritos, depreende-se incontroverso que a testadora não possuía herdeiros necessários e que contemplou, por meio de testamento público, duas obras de arte deixadas ao MAM/RJ, 25% do seu patrimônio à sua irmã pré-morta à data da abertura da sucessão e o restante de seus bens aos sobrinhos de seu falecido marido. Infere-se, igualmente, que, no momento da morte de sua irmã, a testadora estava interditada, razão pela qual lhe foi impossível adequar o testamento à nova realidade. Da mesma maneira, ficou certo que o testamenteiro afirmou peremptoriamente, reforçando o coro dos recorridos, que, à exceção das duas obras de arte destinados ao MAM/RJ e na falta da irmã, a intenção da testadora era deixar todos os bens restantes para os sobrinhos de seu falecido marido. Conclui-se, por último, que o Município do Rio de Janeiro, ora recorrente, reclama o percentual de 25% deixado à irmã pré-morta na qualidade de herança jacente, face à falta de herdeiros necessários e à inexistência da cláusula de acrescer. O acórdão recorrido, confirmando a decisão de primeira instância, entendeu pela necessidade de interpretação do testamento para além da literalidade, isto é, para buscar-se a real manifestação de última vontade do testador, que, no presente caso, compreendeu fosse a de deixar todos os seus bens, a exceção das duas obras de arte ao MAM/RJ, a seus familiares, especialmente, aos sobrinhos do casal, pronunciando-se nestes termos (e-STJ, fls. 479): Na interpretação dos atos jurídicos, deve-se atentar mais para a intenção neles consubstanciadas do que ao sentido literal da linguagem (Cód. Civil, art. 112), em especial no caso de testamento, cujo cumprimento só ocorrerá quando o declarante não mais estiver presente, daí que deve prevalecer, sempre, a interpretação que melhor assegure a observância da vontade do testador (Cód. Civil, art. 1899). Na lição de Caio Mario da Silva Pereira (Instituições de Direito Civil, Forense, 15a edição, 2004, vol. VI, atualizado por Carlos Roberto Barbosa Moreira), "não se pode perder de vista, além do que acima se disse, que ao fator psíquico da declaração testamentária não falta o elemento afetivo..." (pág. 268). Enfim, cabe transcrever um pequeno trecho da decisão agravada, cuja integra passa a fazer parte deste aresto, na forma regimental. Verbis: "... 20. Não é crível que uma pessoa sem herdeiros necessários que deixou testamento dispondo sobre todo o seu patrimônio tivesse a in- tenção de, na falta de um dos legatários, deixar bens para a municipalidade. Especialmente pelo fato de que quando a inventariada desejou deixar parte do seu patrimônio para outros que não os beneficiários objetivamente referidos, ela o fez deixando obras de arte destina- das ao MAM. Portanto, foge à lógica do razoável que por uma interpretação literal, que abandona a vontade da testadora, se aceite que existe herança jacente. Não. Não existe, conforme acima explanado, utilizando-se interpretação mais contemporânea com a nossa realidade e, insista-se, fazendo-se valer a real vontade daquela que testou. Por todo o até aqui exposto, portanto, verifica-se que a essência da controvérsia posta em debate passa por três grandes temas do direito das sucessões, a saber: o princípio da prevalência da vontade do testador, as substituições testamentárias e a herança jacente, com o objetivo de esclarecer o modo pelo qual as disposições testamentárias devem ser interpretadas a fim de que se cumpra a última vontade do testador. 3. Cabe ressaltar, ainda, que no caso em foco não se aplica o óbice da Súmula 5 da Casa, pois o exame das teses jurídicas relativas à principiologia hermenêutica voltada às disposições testamentárias, assim como à verificação das hipóteses do direito de acrescer, das substituições testamentárias e da herança jacente clamam pelo pronunciamento deste Colegiado, afastando o referido óbice sumular. 4. Estabelecida tal premissa, saliente-se ser tarefa do intérprete do testamento desvendar o conteúdo duvidoso do ato, elucidar a essência da vontade expressada, buscar o seu verdadeiro sentido, a sua exata significação. Nas palavras de Carlos Maximiliano ?esforça-se o intérprete por fixar, através de todas as circunstâncias, a vontade real do testador, contida em cada disposição? (MAXIMILIANO, Carlos. Direito das Sucessões. apud MALUF, Carlos Alberto Dabus; MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Curso de Direito das Sucessões. São Paulo: Editora Saraiva, 2013, p. 341). Na esteira desse raciocínio, Carlos Roberto Gonçalves destaca, por sua vez, que mesmo a aparente clareza do texto não afasta a atividade interpretativa, salientando que o brocardo romano in claris cessat interpretatio não mais prevalece de forma absoluta, pois até ?para afirmar que o contrato, ou o testamento, é claro é preciso interpretá-lo" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. VII. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 323). Dessa forma, vê-se que a missão do juiz dos testamentos é interpretá-lo a fim de resguardar o melhor possível a vontade do testador. A doutrina nomeia essa direção interpretativa como princípio da soberania da vontade do testador, que Pontes de Miranda chamou de o "coração do direito testamentário". Assim, para o autor, o intérprete deve "antes que tudo e acima de tudo": Encher os vazios, remediar os defeitos (...); investigar a verdadeira vontade; suprir no sentido da vontade do testador; penetrar em suas intenções para ver, lá dentro, o que o testamento o disponente quis. Nada de agarrar-se às palavras, como que a castigar o testador pelo que disse mal. No fundo da sua consciência, ele deve ser sempre a palavra de comando: Salve, se possível, a verba! (MIRANDA, Pontes. Tratado sobre testamentos. Vol. III. São Paulo: Bookseller, 2005, p. 170.) Importante notar que esse princípio interpretativo consolidou-se ainda sob a égide do Código Civil de 1916, que dispôs, em seu art. 1.666: "Quando a cláusula testamentaria for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador". E, hodiernamente, encontra albergue no art. 1.899 do Código Civil de 2002: Art. 1.899. Quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador. Logo, entende-se que se a intenção do testador é manifestada com clareza, podendo ser facilmente interpretada, e com segurança, não deve o intérprete ir além, buscando outro sentido ou efeito. Em sendo, porém, equívoca a disposição, indispensável se torna a pesquisa da real vontade do disponente, levando-se em conta, para tanto, "a pessoa do testador, sua idade, caráter, estado de saúde, nível cultural e intelectual, modo como se expressava, o ambiente em que vivia, suas relações familiares e afetivas; enfim, tem o intérprete, se é bom interprete, de se colocar no lugar do testador, levando em conta as circunstâncias que o envolviam, quanto testou. A apuração da vontade, com tais providências, será mais segura, fidedigna. Mais humana, com certeza" (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. VII. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 327). Dessa forma, quando a palavra escrita não for clara e ensejar várias interpretações, deverá prevalecer a que melhor assegure a observância da vontade do testador. Sob a égide do Código Civil de 1916, esta Corte Superior abraçou referido princípio, consoante exemplificam os seguintes precedentes: CIVIL. ACÓRDÃO ESTADUAL. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. INVENTÁRIO. TESTAMENTO. QUINHÃO DE FILHA GRAVADO COM CLÁUSULA RESTRITIVA DE INCOMUNICABILIDADE. HABILITAÇÃO DE SOBRINHOS E NETOS. DISCUSSÃO SOBRE A SUA EXTINÇÃO EM FACE DA CLÁUSULA, PELO ÓBITO, ANTERIOR, DA HERDEIRA, A BENEFICIAR O CÔNJUGE SUPÉRSTITE. PREVALÊNCIA DA DISPOSIÇÃO TESTAMENTÁRIA. CC, ARTS. 1676 E 1666. I. A interpretação da cláusula testamentária deve, o quanto possível, harmonizar-se com a real vontade do testador, em consonância com o art. 1666 do Código Civil anterior. (...) III. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 246.693/SP, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 04/12/2001, DJ 17/05/2004, p. 228) CIVIL. SUCESSÃO. TESTAMENTO. FORMALIDADES. EXTENSÃO. O testamento é um ato solene que deve submeter-se a numerosas formalidades que não podem ser descuradas ou postergadas, sob pena de nulidade. Mas todas essas formalidades não podem ser consagradas de modo exacerbado, pois a sua exigibilidade deve ser acentuada ou minorada em razão da preservação dos dois valores a que elas se destinam - razão mesma de ser do testamento -, na seguinte ordem de importância: o primeiro, para assegurar a vontade do testador, que já não poderá mais, após o seu falecimento, por óbvio, confirmar a sua vontade ou corrigir distorções, nem explicitar o seu querer que possa ter sido expresso de forma obscura ou confusa; o segundo, para proteger o direito dos herdeiros do testador, sobretudo dos seus filhos. Recurso não conhecido. (REsp 302.767/PR, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 05/06/2001, DJ 24/09/2001, p. 313) Assim também o fez sob a luz do Código Civil de 2002: AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE TESTAMENTO PÚBLICO. VÍCIO DE FORMA. FLEXIBILIZAÇÃO. PREVALÊNCIA DA REAL VONTADE DO TESTADOR. IMPOSSIBILIDADE DE DISCUTIR O ACERTO OU DESACERTO NA APLICAÇÃO DE REGRA TÉCNICA DE CONHECIMENTO DE RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. ACÓRDÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM A ATUAL JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA 168/STJ. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. (...) 3. Ademais, ambas as Turmas da 2ª Seção desta Corte Superior têm contemporizado o rigor formal do testamento, reputando-o válido sempre que encerrar a real vontade do testador, manifestada de modo livre e consciente, como reconhecido pelo acórdão recorrido, circunstância que faz incidir o óbice da Súmula 168/STJ. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg nos EAREsp 365.011/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/10/2015, DJe 20/11/2015) Portanto, na busca pela real vontade do testador, deve ser adotada a solução que maior eficácia e utilidade reconheça à cláusula escrita, ou, nas palavras de Pontes de Miranda, a expressão que "assegure a observância da vontade do testador" que "assegure eficácia, resultado, à disposição". "Vale dizer, adotar a interpretação, mediante a qual valha o que o testador dispôs (...) assim, na dúvida, há de entender-se que o testador quis o juridicamente possível, e não o juridicamente impossível, que lhe tornaria ineficaz toda a disposição. Mais: que ordenou o lícito, e não o ilícito, se cabe duvidar-se do que ele quis. Além disto, que subordinou o querer a condição fisicamente possível e não a impossível, que seria inexistente. Sempre que a dúvida dê ensejo a entendimento diferentes, e um deles dá eficácia, mais completa eficácia, ou mais plenamente serve à observância do querer, este se já de ter por mais acertado. É um dos favores do direito testamentário" (MIRANDA, Pontes. Tratado sobre testamentos. Vol. III. São Paulo: Bookseller, 2005, p. 184). Aliado a esse princípio interpretativo, acrescenta-se o princípio constante do art. 112 do diploma civil, segundo o qual  "nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem". Portanto, partindo-se da premissa da similitude das regras de interpretação dos contratos com as do testamento, cabe ressaltar que esta Corte Superior já se pronunciou, no tocante à aplicação do art. 112 do Código Civil de 2002, no sentido de que a real vontade do declarante ? contratante ou testador ? deve ser buscada no próprio ato de declaração de vontade. Assim, o entendimento manifestado no julgamento do REsp n. 1.013.976/SP, da relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, em cujo voto condutor extrai-se: No particular, quanto à interpretação de negócios jurídicos, vem a calhar a correta hermenêutica do art. 112 do Código Civil de 2002 - mais técnico e explícito que o anterior -, que não se apegou nem à vontade psíquica do agente nem à literalidade da manifestação, mas à intenção consubstanciada nas declarações, verbis: Art. 112. Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. De fato, o intérprete deve partir das declarações externadas para alcançar, na medida do possível, a manifestação efetivamente desejada, sem conferir relevância, dessa forma, à vontade omitida na declaração. Essa é a sempre valiosa doutrina de Pontes de Miranda: Diz o art. 85, do Código Civil: "Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem". A regra jurídica de interpretação que se edicta no art. 85 impõe que se veja, através do sentido literal, a intenção ou propósito do manifestante da vontade. De modo nenhum se disse que o sentido literal é sem importância, ou que se poderia buscar a intenção para se entender algo diferente do que foi dito; apenas se explicitou que a intenção há de servir, ao lado, ou, até, afastando o sentido literal, na interpretação da vontade manifestada. [...] Objeto da interpretação não é a vontade interior, que o figurante teria podido manifestar, mas sim a manifestação de vontade, no que ela revela da vontade verdadeira do manifestante. É preciso que o querido esteja na manifestação; o que não foi manifestado não entra no mundo jurídico; o simples propósito, que se não manifestou, não pode servir para a interpretação. A vontade, ainda que buscada segundo o art. 85, há de estar dentro, não fora, nem, com maioria de razão, contra o que se manifestou. A decida em profundidade é dentro das raias do manifestado (MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado, tomo 3. Campinas: Bookseller, 2001, p. 375-377, sem grifo no original). Em síntese, com base nos delineamentos doutrinários supra referidos, pode-se determinar as seguintes premissas quanto à aplicação do princípio da predominância da vontade do testador na interpretação dos testamentos: a) naquelas hipóteses em que a texto escrito ensejar várias interpretações, deverá prevalecer a que melhor assegure a observância da vontade do testador; b) na busca pela real vontade do testador, deve ser adotada a solução que confira maior eficácia e utilidade à cláusula escrita; c) para poder aferir a real vontade do testador, torna-se necessário apreciar o conjunto das disposições testamentárias, e não determinada cláusula que, isoladamente, ofereça dúvida; e d) que a interpretação buscada deve ser pesquisada no próprio testamento, isto é, a solução deve emergir do próprio texto do instrumento. 5. Partindo das premissas supra estabelecidas, colhe-se, no caso em exame, que a intenção da testadora era deixar seu patrimônio para seus entes próximos, na hipótese de ausência de sua irmã, contemplando os sobrinhos de seu marido - que se não parentes no aspecto jurídico, o eram em vida -, com a totalidade dos seus bens, à exceção das duas obras de arte destinadas ao MAM/RJ. Tal conclusão pode ser extraída das próprias declarações do testamento, que postas em um único parágrafo, devem ser interpretadas em conjunto, e, não isoladamente. Assim, transcreve-se o trecho em questão para melhor esclarecer o debate (e-STJ, fl. 140): II) que, não tendo ascendentes nem descendentes, podendo, por conseguinte, dispor da totalidade de seus bens, a Testadora deixa os dois seguintes legados, livres de quaisquer ônus ou encargos, para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, situado nesta cidade, na Av. Beira Mar, s/n; a) a tapeçaria de Lurçat, assinada, sem data, denominada "Noite Tropical", medindo 2,68 x 4,18m; b) o quadro de autoria do pintor Cândido Portinari denominado "Bordas de Cana" (sic), painel de pintura de tempera, sobre madeira, medindo 1,80m x 4,00m, 1956/57, com dez figuras em tamanho natural, estabelecendo a testadora, como obrigação do donatário, a inscrição do nome de seu falecido marido Francisco Clementino de San Tiago Dantas, a cuja coleção e arte a tapeçaria e o quadro pertencerem, sendo que ambas as peças se acham na residência da testadora; III) que ela testadora, deixa 25% (vinte e cinco por cento), do restante de todos os bens que lhe constituem o patrimônio, para a sua irmã Edmée de Carvalho Brandão; IV) que deixa o restante de seus bens, em partes iguais, a seus sobrinhos, filhos de João José Barbosa Quental e Dulce Maria de San Tiago Dantas Barbosa Quental, já falecidos, sendo os que faltarem representados por seus descendentes, se os tiverem, e indo, em caso contrário, suas quotas acrescer às dos demais; V) que as deixas de caráter efetivo e remuneratório serão reguladas em codicilos; (...) Desse modo, levando-se em consideração a amplitude da manifestação de vontade externada no testamento, é cristalina a interpretação de que a real intenção da testadora era deixar todos os seus bens aos seus familiares, tanto que a expressão utilizada para a deixa dos sobrinhos é ?o restante dos seus bens?, justamente para reforçar o intento de que, na falta de um ou outro herdeiro, o patrimônio permanecesse no seio familiar. Logo, na existência de cláusula testamentária duvidosa, que remete a interpretações distintas, como a presente, deve o intérprete compreendê-la de modo que melhor se harmonize com a vontade manifestada pelo testador, em atenção ao princípio da soberania da vontade do testador, insculpido, como dito, no artigo 1.899 do Código Civil. Portanto, na busca pela melhor exegese das disposições testamentárias, faz-se relevante transcrever a conclusão alcançada pelo testamenteiro, o ex-Ministro de Estado Marcílio Marques Moreira, que, em carta narrou (e-STJ, fls. 375-376): Na qualidade de testamenteiro nomeado pela Sra. Edméa de San Tiago Dantas, venho à presença de Vossa Excelência, em atenção à intimação de fls, para trazer meu depoimento sobre a questão surgida no trâmite do inventário, de que parte da herança da testadora deveria ser revertida ao Município do Rio de Janeiro. (...) Não tendo filhos, outros irmãos ou parentes próximos de sua linhagem, a relação familiar mais próxima de Edméa circunscreveu-se a seus pais e a sua irmã Edmée, enquanto viviam, e aos sobrinhos de San Tiago, a quem o casal dedicou especial atenção e amor. (...) Conhecendo bem a testadora, não me parece crível nem razoável que ela, sem outros herdeiros legítimos, quisesse deixar seus bens ao Município do Rio de Janeiro ou a qualquer outra entidade fora da família. Quando quis fazê-lo, como no caso do legado ao MAM, ela o fez explicitamente e especificamente, nomeando a instituição e os bens correspondentes. Não haveria de fazer diferentemente, e através de uma tecnicalidade jurídica, no caso do Município. Nunca tive dúvida de que, no caso do falecimento de sua irmã antes do seu, D. Edméa entendia que, com a exceção das duas obras de arte destinados ao MAM, todos bens restantes reverteriam para o conjunto dos sobrinhos do casal. Com efeito, quando a testadora quis destinar parte dos seus bens para ente alheio ao seio familiar, fê-lo expressamente, ao destinar as obras de arte ao MAM/RJ. Some-se a isso o fato de que "quando do falecimento da irmã Edmée, ocorrido em 11/02/2008 (fls. 302), a testadora estava interditada (fls. 303), daí que sequer teve a oportunidade de adequar seu último ato de vontade à nova situação, isto que, por certo o faria, a fim de contemplar os seus sobrinhos com a parte que havia legado à irmã falecida" (e-STJ, fl. 479). Dessa forma, em razão da interpretação conjunta das disposições testamentárias à luz da aplicação do princípio da soberania da vontade do testador, chega-se à conclusão inegável da inexistência de herança jacente na hipótese, devendo a quota-parte da herdeira pré-morta reverter em benefício dos sobrinhos. De outro lado, cabe ressaltar, que a interpretação contrária do testamento, isto é, no sentido de que a testadora, de maneira silenciosa, tácita, teria querido deixar 25% dos seus bens para o Município na ausência de sua irmã, em detrimento de seus sobrinhos, conduziria a uma situação, que como bem arrematou o magistrado de primeira instância (e-STJ, fl. 435), "desproporcional e irrazóavel, que foge ao bom senso e, logo, se afasta do Direito". Assim, a interpretação do testamento como defendida pelos recorrentes vai de encontro aos ditames da interpretação teleológica, pautada nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, normatizada pelo art. 1.899 do Código Civil. 6. O Município recorrente ainda defende que na presente hipótese, em face da caducidade do legado pela pré-morte da beneficiária somada a ausência de direito de acrescer, subsistiria a sucessão legítima da quota vaga, em atendimento ao disposto nos arts. 1.788, 1.829, 1.844, 1.906, 1.944, 1.939, V, do Código Civil, mormente porque, no presente caso, não houve a instituição expressa de substituição testamentária, nos moldes preconizados pelo art. 1.947 do Código Civil, e que não se pode presumi-la. Com efeito, o direito de acrescer é decorrência da vontade presumida do testador, ou seja, presume a lei que o testador desejava instituir o direito de acrescer para os demais co-herdeiros, ou co-legatários, caso um deles viesse a faltar, embora não fizesse alusão ao jus accrescendi no ato de última vontade. Tal instituto tem previsão no art. 1.941 do Código Civil, que assim estabelece: Art. 1.941. Quando vários herdeiros, pela mesma disposição testamentária, forem conjuntamente chamados à herança em quinhões não determinados, e qualquer deles não puder ou não quiser aceitá-la, a sua parte acrescerá à dos co-herdeiros, salvo o direito do substituto. Em outras palavras, o direito de acrescer ocorre naquelas hipóteses em que, havendo vários herdeiros favorecidos com uma só liberalidade, a quota do titular faltante, que não quer ou não pode receber, será aumentada à parte de outro. Como explicitou Pontes de Miranda, quis a lei que, na falta de um dos sucessores, os outros adquiram a sua quota "como se não houvesse existido o que faltou". (apud NONATO, Orosimbo. Estudos sobre sucessão testamentária. Vol. III. Ed. Revista Forense, 1957, p. 219.) Nas lição de Maria Helena Diniz, "o direito de acrescer (jus accrescendi) consiste no direito de co-herdeiro ou co-legatário de receber o quinhão originário de outro co-herdeiro ou co-legatário, que não quis ou não pôde recebê-lo, desde que sejam, pela mesma disposição testamentária, conjuntamente chamados a receber a herança ou o legado" (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1.319). A doutrinadora ainda salienta que para que haja o direito de acrescer é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: a) nomeação de co-herdeiros, ou co-legatários na mesma disposição testamentária para recolher o acervo hereditário ou porção dele; b) incidência na mesma herança, já que a deixa deve abranger os mesmos bens ou a mesma porção de bens; c) ausência de determinação das quotas de cada um e de indicação de substituto. (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 1.320.) Diante desse quadro, constata-se que razão assiste ao recorrente quando diz que não há direito de acrescer na hipótese, visto que não estão presentes os requisitos necessários para configuração do instituto, pois, a testadora, na mesma disposição testamentária (disposição conjuntiva), designou seus herdeiros especificando o quinhão de cada um, o que, em tese, configuraria, a chamada conjunção verbal (verbis tantum, em contraposição às conjunções re tantum e re et verbis) (Cf.: NONATO, Orosimbo. Estudos sobre Sucessão Testamentária. Vol. II. Ed. Forense, 1957, p. 224-225). Esta Corte Superior já teve oportunidade de se manifestar sobre o tema, para concluir que, de fato, "Quando o testador fixa a cota ou o objeto de cada sucessor, não há direito de acrescer. Ocorre a conjunção verbis tantum quando são utilizadas as expressões partes iguais, partes equivalentes ou outras que denotem o mesmo significado, o que exclui o direito de acrescer." (REsp 566.608/RS, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/10/2004, DJ 17/12/2004, p. 525). Nesse mesmo sentido: REsp 565.097/RS, Rel. Ministro CASTRO FILHO, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2004, DJ 19/04/2004, p. 197 e REsp 594.535/SP, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 19/04/2007, DJ 28/05/2007, p. 344. Contudo, a concordância com os argumentos levantados pelo Município recorrente, acerca da inexistência do direito de acrescer na espécie, param neste ponto, e isso porque esse pretende ver reconhecida a incidência dos arts. 1.788, 1.829, 1.844, 1.906, 1.939, V, 1.944 e 1.947 do Código Civil, para que haja a transmissão da quota da herdeira pré-morta aos herdeiros legítimos e, em última análise, em razão da ausência desses, ao próprio Município; quando, na verdade, a interpretação do testamento, segundo o princípio da soberania da vontade do testador, leva à conclusão de que a testadora previu hipótese de substituição testamentária. Com efeito, consiste a substituição testamentária na disposição segundo a qual o testador indica uma pessoa para receber, no todo ou em parte, a herança ou legado, quando o herdeiro ou legatário primitivo não herda, seja porque faleceu antes de aberta a sucessão, foi excluído ou renunciou seu direito, podendo, como se sabe, ser ordinária, recíproca, fideicomissária ou compendiosa. Aqui interessa a substituição ordinária ou vulgar, pela qual haverá a convocação direta e imediata do substituto em caso de falta do herdeiro primitivo, conforme estabelece os arts. 1.947 e 1.948 do Código Civil: Art. 1.947. O testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao legatário nomeado, para o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado, presumindo-se que a substituição foi determinada para as duas alternativas, ainda que o testador só a uma se refira. Art. 1.948. Também é lícito ao testador substituir muitas pessoas por uma só, ou vice-versa, e ainda substituir com reciprocidade ou sem ela. Assim, tendo o conta o caso em exame, pode-se concluir, com base no princípio da predominância da vontade do testador, que, de fato, houve a designação de substituição testamentária entre a irmã da testadora e sobrinhos de seu marido, como destacou o acórdão recorrido (e-STJ, fl. 478): Como bem ressaltado em contrarrazões e também no parecer do ilustre Procurador de Justiça João Martins Freitas, a vontade da testadora, efetivamente, era dispor de todos os seus bens em favor de seus familiares, a irmã gêmea e os sobrinhos, nunca para o município. Isto é o que se extrai da leitura do testamento visto às fls. 146/151, trasladado às fls. 130/133 o qual se verifica, quanto à deixa para os sobrinhos, que houve ressalva de que as cotas dos que faltarem seriam acrescidas às dos demais (cláusula IV), devendo-se entender que assim também o seria na falta da irmã (cláusula III). Dessa forma, a interpretação teleológica do testamento de acordo com a real vontade da testadora, em observância dos artigos 112 e 1.899 do Código Civil, conduz à conclusão de que Edméa objetivamente desejava que todo seu patrimônio, a exceção das duas obras legadas ao MAM/RJ, fosse repartido entre sua irmã e os sobrinhos de seu marido e que, em consequência, a previsão de substituição recíproca escrita na parte final da disposição testamentária abrange à da irmã. Assim, transcreve-se novamente a disposição testamentária para melhor compreensão do debate: III) que ela testadora, deixa 25% (vinte e cinco por cento) do restante de todos os bens que lhe constituam o patrimônio, para a sua irmã Edmée de Carvalho Brandão; IV) que deixa o restante de seus bens, em partes iguais, a seus sobrinhos, filhos de João José Barbosa Quental e Dulce Maria de San Tiago Dantas Barbosa Quental, já falecidos, sendo os que faltarem representados por seus descendentes, se os tiverem, e indo, em caso contrário, suas quotas acrescer às dos demais." (fl. 112). Portanto, partindo da premissa que as disposições do Código Civil neste ponto são unicamente supletivas da vontade do testador, deve ser excluída a tese referente à aplicação do art. 1.944 do Código Civil à presente hipótese, uma vez que pela aplicação do princípio da soberania da vontade do testador, compreende-se que houve designação de substituição testamentária recíproca entre os legatários, de tal sorte que a quota vaga deve ser revertida em proveito dos sobrinhos do falecido marido da testadora. 7. Ademais, tal conclusão também é corroborada pela noção de que o instituto da herança jacente foi desenvolvido para proteger o patrimônio do de cujus de eventuais abusos de terceiros, destinando-o à coletividade, na pessoa do Estado, nas hipóteses em que alguém falece ?sem deixar testamento nem herdeiro legítimo notoriamente conhecido? (art. 1.819 do Código Civil) ou quando ?todos os chamados a suceder renunciarem a herança? (art. 1.823 do Código Civil). Em assim sendo, a mens legis que orienta o instituto é de considerá-lo como a ultima ratio, isto é, considerar a ocorrência da jacência em última análise quando, de nenhuma outra forma, for possível atribuir a herança a quem de direito Nesse sentido Francisco José Cahali explica "Por qualquer das hipóteses legais verifica-se, em última análise, a ocorrência da jacência quando ignorada a existência de herdeiros (legítimos ou testamentários) que reclamem ou não repudiem a herança". (CAHALI, Franciso José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes. Direito das Sucessões. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 87). Isso significa dizer que o poder público só entra como sucessor irregular quando não existir nenhum herdeiro, havendo este, afasta-se este da condição de beneficiário dos bens do de cujus. (DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, fl. 1.273.), conforme se depreende da leitura do art. 1.844 do Código Civil: Art. 1.844. Não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível, ou tendo eles renunciado a herança, esta se devolve ao Município ou ao Distrito Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território federal. Portanto, a interpretação consentânea com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como ao princípio da soberania da vontade do testador é aquela que, analisando o conjunto das disposições testamentárias, entende que a real manifestação de última vontade da testadora Edméa de Carvalho Brandão era dispor da totalidade de seu patrimônio aos seus familiares, na pessoa de sua irmã e sobrinhos, e que na ausência de um ou outros, houvesse a reversão em benefício dos demais. Desse modo, não há que se falar em sucessão legítima na presente hipótese, devendo se rejeitada a alegação de violação dos arts. 1.788, 1.829, 1.906, 1.844, 1.939, V, 1.944 e 1.947 do Código Civil. 8. Destaca-se, além disso, que a Quarta Turma desta Corte já teve a oportunidade de analisar situação semelhante a dos autos, por ocasião do julgamento do REsp n. 147.959/SP, da relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, que foi apontado como paradigma pelo Município recorrente para fins de interposição do especial pela alínea c do permissivo constitucional. Referido julgado recebeu a seguinte ementa: DIREITO CIVIL. TESTAMENTO PÚBLICO. FALECIMENTO DA HERDEIRA TESTAMENTÁRIA ANTES DA TESTADORA. NOMEAÇÃO POSTERIOR DAS FILHAS DA HERDEIRA POR PROCURAÇÃO PARTICULAR. IMPOSSIBILIDADE. RIGOR FORMAL. SOLENIDADE ESSENCIAL. ARTS. 1.592, II, 1.717 E 1.746, CC. CONVERSÃO DE INVENTÁRIO EM HERANÇA JACENTE. POSSIBILIDADE. ECONOMIA PROCESSUAL. ART. 1.142, CPC. RECURSO DESACOLHIDO.I - A mitigação do rigor formal em prol da finalidade é critério que se impõe na interpretação dos textos legais. Entretanto, no caso dos testamentos, deve-se redobrar o zelo na observância da forma, tanto por não viver o testador no momento de esclarecer suas intenções, quanto pela suscetibilidade de fraudes na elaboração do instrumento e, conseqüentemente, na deturpação da vontade de quem dispõe dos bens para após a morte.II - A revogação parcial do testamento, para substituir a herdeira anteriormente nomeada e já falecida, deve dar-se pelo mesmo modo e forma do anterior (art. 1.746 do Código Civil), não tendo a procuração ad judicia por instrumento particular esse condão revogador.III - A capacidade para adquirir por testamento pressupõe a existência do herdeiro, ou legatário, à época da morte do testador.Tendo falecido antes o herdeiro, perde validade a cédula testamentária.IV - Na lição de Pontes, "a nulidade dos atos jurídicos de intercâmbio ou inter vivos é, praticamente, reparável: fazem-se outros, com as formalidades legais, ou se intentam ações que compensem o prejuízo, como a ação de in rem verso. Não se dá o mesmo com as declarações de última vontade: nulas, por defeito de forma, ou por outro motivo, não podem ser renovadas, pois morreu quem as fez. Razão maior para se evitar, no zelo do respeito à forma, o sacrifício do fundo" (Tratado de Direito Privado, t. LVIII, 2a ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1969, § 5.849, p. 283).V - Iniciado o inventário e, no seu curso, verificada a inexistência de herdeiro testamentário, é de considerar-se jacente a herança, nos termos do art. 1.592, II, CC, caso em que "o juiz, em cuja comarca tiver domicílio o falecido, procederá sem perda de tempo à arrecadação de todos os seus bens" (art. 1.142, CPC). A conversão do procedimento e a nomeação do curador dá cumprimento a essa norma e atende ao princípio da economia processual, nele expressamente assentado.(REsp 147.959/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 14/12/2000, DJ 19/03/2001, p. 111) Porém, não é aqui de se cogitar em qualquer afronta ao rigor formal próprio do instituto dos testamentos, pois não se está criando regra não inserta ou mesmo modificando disposições testamentária por instrumento particular. Assim, em que pese esta Corte já ter se pronunciado em lide semelhante, não é o caso de reconhecer-se dissídio jurisprudencial, uma vez que as hipóteses trazidas não guardam similitude fática entre si, pois no presente conflito a expressão da vontade está presente no próprio testamento, enquanto no caso apontado como paradigma ? REsp n. 147.959/SP ?, a vontade da testadora, em substituir a herdeira testamentária pré-morta por suas filhas, estava fora do instrumento testamentário, manifestada por meio de uma procuração em instrumento particular, assinada pela testadora, um mês antes da própria morte. Logo, é inviável o conhecimento do recurso especial lastreado na alínea c do permissivo constitucional ante a ausência de similitude fática. A propósito: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ART. 105, III, "C", DA CF/88. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. COTEJO ANALÍTICO NÃO REALIZADO. SIMILITUDE FÁTICA. AUSÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Para a configuração do dissídio jurisprudencial, faz-se necessária a indicação das circunstâncias que identifiquem as semelhanças entre o aresto recorrido e os paradigmas citados, nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC/73 e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ. Na hipótese, contudo, o agravante não procedeu ao devido cotejo analítico entre os arestos confrontados, de modo que não ficou caracterizada a sugerida divergência pretoriana. 2. O recurso especial fundado na divergência jurisprudencial somente tem cabimento quando os acórdãos recorrido e paradigma, proferidos sobre idêntica base fática, chegam a conclusão jurídica diversa. Não havendo similitude fática entre o acórdão recorrido e o paradigma colacionado, é inviável o conhecimento do recurso. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 816.040/MG, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 18/06/2013) AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SEGURO DE VIDA. CANCELAMENTO UNILATERAL. VIOLAÇÃO DO ART. 188, I, DO CC. SÚMULA N. 7/STJ. INCIDÊNCIA. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. BASES FÁTICAS DISTINTAS. [...] 2. Não se conhece da divergência jurisprudencial quando os julgados dissidentes cuidam de situações fáticas diversas. 3. Agravos internos desprovidos. (AgInt no AREsp 407.995/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 24/06/2016) 9. Do exposto, NEGA-SE provimento ao recurso especial. É como voto.