AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 672.435 - RS (2015/0046838-5)
RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AGRAVANTE : UNIÃO
AGRAVADO : CARLA ANDREA SCHUCK
ADVOGADO : DENISE GOMES SIQUEIRA DE GRANDI E OUTRO(S) - RS032152
RELATÓRIO
1. Trata-se de Agravo Regimental interposto contra decisão de minha relatoria, assim ementada:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III DA LEI 8.112/90. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. SITUAÇÃO DE FATO CONSOLIDADA. PRECEDENTES. AGRAVO DESPROVIDO.
2. Em suas razões recursais, a parte agravante defende, em suma, que a teoria do fato consumado não se aplica ao caso em comento.
3. Pugna, desse modo, a reconsideração da decisão ora atacada ou a apresentação do feito à Turma Julgadora para que seja provido o recurso.
4. É o relatório.
AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 672.435 - RS (2015/0046838-5)
RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AGRAVANTE : UNIÃO
AGRAVADO : CARLA ANDREA SCHUCK
ADVOGADO : DENISE GOMES SIQUEIRA DE GRANDI E OUTRO(S) - RS032152
EMENTA
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III DA LEI 8.112/1990. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. SITUAÇÃO SOBRE A QUAL O TEMPO ESTENDEU O AMPLO MANTO DA SUA JUSTA IMODIFICABILIDADE. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO NO JULGAMENTO DO ERESP 1.247.360/RJ, REL. MIN. BENEDITO GONÇALVES, DJE 29.11.2017. AGRAVO DA UNIÃO A QUE SE DÁ PROVIMENTO, COM RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR.
1. Na hipótese vertente, a situação fática está consolidada no tempo, haja vista que a parte requerente teve deferida sua lotação em Porto Alegre-RS, por meio de decisão judicial, no ano de 2012, ressalte-se que o referido provimento não foi liminar, e sim proferido quando do julgamento da Apelação pela Corte a quo. Ademais, a transferência, por si só, não implica prejuízos para a Administração, pois a autora continua a prestar seus serviços à Superintendência no Estado do Rio Grande do Sul. Destarte, de acordo com entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, implícitos no ordenamento jurídico, a regra do art. 36, parágrafo único, III da Lei 8.112/1990, deve ser mitigada.
2. Sendo assim, este é um caso excepcional, em que a restauração da estrita legalidade ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada. Precedentes: AREsp. 883.574/MS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 19.10.2017; AgRg no AREsp. 445.860/MG, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 28.3.2014 e AgRg no Ag 1.397.693/SP, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 23.3.2012.
3. Aplicação da orientação doutrinária do Jusfilósofo alemão, Professor KARL ENGISCH (1899-1990), reportando lição do Professor HANS REICHEL (1892-1958) que, nos idos de 1915, asseverou que o Juiz é obrigado, por força do seu cargo, a afastar-se conscientemente de uma disposição legal, quando essa disposição de tal modo contraria o sentimento ético da generalidade das pessoas que, pela sua observância, a autoridade do Direito e da Lei correria um perigo mais grave do que através da sua inobservância (Introdução do Pensamento Jurídico. Tradução de J. Baptista Machado. Lisboa: Gulbenkian, 1965, p.272).
4. Ademais, em atenção ao princípio insculpido no art. 226 da Constituição Federal, insta reconhecer que tem o Estado interesse na preservação da família, considerada base sobre a qual se assenta a sociedade. Outrossim, não se olvida que aludido princípio não pode ser aplicado de forma indiscriminada, merecendo cada caso concreto uma análise acurada de suas particularidades.
5. Entretanto, em atenção à função uniformizadora desta Corte Superior, a qual, pela sua Primeira Seção, consolidou entendimento de que não há direito à remoção para acompanhar cônjuge em casos como o dos autos (EREsp 1.247.360/RJ, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 29.11.2017), dá-se provimento ao Agravo Regimental da União, com ressalva do ponto de vista do Relator.
AgRg no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 672.435 - RS (2015/0046838-5)
RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AGRAVANTE : UNIÃO
AGRAVADO : CARLA ANDREA SCHUCK
ADVOGADO : DENISE GOMES SIQUEIRA DE GRANDI E OUTRO(S) - RS032152
VOTO
1. A despeito das alegações da parte agravante, razão não lhe assiste, devendo a decisão agravada ser mantida.
2. Conforme anteriormente afirmado, em atenção ao princípio insculpido no art. 226 da Constituição Federal, insta reconhecer que tem o Estado interesse na preservação da família, considerada base sobre a qual se assenta a sociedade.
3. Outrossim, não se olvida que aludido princípio não pode ser aplicado de forma indiscriminada, merecendo cada caso concreto uma análise acurada de suas particularidades.
4. Na hipótese vertente, a situação fática está consolidada no tempo, haja vista que a parte requerente teve deferida sua lotação em Porto Alegre-RS, por meio de decisão judicial, no ano de 2012. Ademais, a transferência, por si só, não implica prejuízos para a Administração, posto que a autora continua a prestar seus serviços à Superintendência no Estado do Rio Grande do Sul. Destarte, de acordo com entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, implícitos no ordenamento jurídico, a regra do art. 36, parágrafo único, III da Lei 8.112/1990 deve ser mitigada.
5. Nesse sentido, os seguintes precedentes:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO PARA ACOMPANHAR O CÔNJUGE. NÃO-ATENDIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III, A, DA LEI 8.112/90. PECULIARIDADE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA HÁ MAIS DE 12 ANOS. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. APLICAÇÃO DA TEORIA DO FATO CONSUMADO.
1. A situação fática está consolidada no tempo, haja vista que, por força de decisão antecipatória de tutela recursal, foi deferida, há mais de doze anos a remoção do servidor.
2. Em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a regra do art. 36, parág. único, III da Lei 8.112/90 deve ser mitigada no caso concreto, devendo ser aplicada a teoria do fato consumado.
3. A questão tratada nos autos foi decidida sem a necessidade de afastamento da norma jurídica por inconstitucionalidade, sendo, portanto, desnecessária a observância do que dispõe o art. 97 da Constituição Federal.
4. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no REsp. 854.555/TO, Rel. Min. VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), DJe 3.8.11).
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ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU O PROCESSAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. ART. 535 DO CPC. OMISSÃO QUE NÃO SE VERIFICA. REMOÇÃO. REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III DA LEI 8.112/90. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. SITUAÇÃO DE FATO CONSOLIDADA. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
Não há falar em omissão quando o Tribunal de origem se manifesta fundamentadamente a respeito de todas as questões postas à sua apreciação, decidindo, entretanto, contrariamente aos interesses da recorrente. Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos apresentados pela parte.
A jurisprudência desta Corte tem entendido que, diante de situações fáticas consolidadas, a regra insculpida no art. 36, parágrafo único, III da Lei 8.112/90 pode ser mitigada.
Agravo Regimental desprovido (AgRg no Ag 1.021.232/RJ, de minha relatoria, DJe 3.8.2009).
6. No caso em comento, o pedido foi deferido, justamente, por ter o Tribunal a quo reconhecido que as circunstâncias do caso concreto indicam a ausência de prejuízo à Administração. Ao analisar a presença/ausência de interesse da Administração não se deve tomar a parte pelo todo, ou seja, a questão não deve ser analisada exclusivamente pela ótica de apenas uma das unidades de seus órgãos. A possibilidade de aproveitamento pelo exercício de atividade compatível com o seu cargo evidencia a existência do interesse e, por outro lado, a ausência de prejuízo para a Administração (fls. 206).
7. Ademais, há a solidificação de situações fáticas ocasionada em razão do excessivo decurso de tempo entre o provimento do Apelo e os dias atuais, de maneira que a reversão desse quadro implicaria inexoravelmente em danos desnecessários e irreparáveis à parte agravada; é o que ocorre no caso dos autos, onde a autora está na nova lotação há 7 anos. Aplica-se, no caso, a Lei Anastasia, que em seu art. 20 dispõe que, nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.
8. Sendo assim, o caso é excepcional, em que a restauração da estrita legalidade ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada. A propósito:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGO DE POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. EXIGÊNCIA DE APROVAÇÃO EM EXAME DE MOTORISMO. POSSE NO CARGO CONCEDIDA POR LIMINAR EM 1999. DECURSO DE MAIS DE 17 ANOS DESDE A CONCESSÃO DA LIMINAR. SITUAÇÃO SOBRE A QUAL O TEMPO ESTENDEU O MANTO DA SUA JUSTA IMODIFICABILIDADE. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DO SERVIDOR CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
1. A controvérsia dos autos diz respeito a possibilidade da permanência no cargo de Policial Rodoviário Federal de candidato que tomou posse mediante liminar deferida em 1999, em razão de sua reprovação na prova de motorismo do concurso daquele ano.
2. É certo que a jurisprudência deste STJ é rigorosamente torrencial e uniforme quanto à obrigatoriedade, tanto por parte dos candidatos quanto da Administração Pública, de seguir fielmente as disposições editalícias como garantia do princípio da igualdade, e sem que isso signifique qualquer submissão a exigências de ordem meramente positivistas, de forma que a reprovação do recorrente em uma das etapas do concurso impõe sua eliminação.
3. Contudo, há uma solidificação de situações fáticas ocasionada em razão do excessivo decurso de tempo entre o concurso de remoção e os dias atuais, de maneira que, a reversão desse quadro implicaria inexoravelmente em danos desnecessários e irreparáveis aos agravados.
4. Caso excepcional em que a restauração da estrita legalidade ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada. Precedentes: AgRg no AREsp. 445.860/MG, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 28.3.2014 e AgRg no Ag 1.397.693/SP, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 23.3.2012.
5. Agravo conhecido para dar provimento ao Recurso Especial do Servidor a fim de assegurar sua manutenção definitiva no cargo de Policial Rodoviário Federal (AREsp. 883.574/MS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 19.10.2017).
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PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL. REMOÇÃO A PEDIDO PARA ACOMPANHAR CÔNJUGE. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. FATO CONSUMADO. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO E FUNDAMENTOS INATACADOS. SÚMULAS 282 E 283 DO STF. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA.
1. Não merece reforma a decisão que não admite especial por ausência de prequestionamento no acórdão atacado.
2. O fato de o acórdão recorrido ter sido lavrado no julgamento de remessa necessária não exime a recorrente de cumprir os requisitos exigidos para inaugurar a instância extraordinária, a exemplo do prequestionamento, o qual deve ser observado inclusive para a análise das questões de ordem pública.
3. A ausência de menção no acórdão recorrido do disposto nos arts. 38 da Lei Complementar n. 73/93 e 6º da Lei n. 9.028/95, sem a provocação do tema nos aclaratórios, atrai a aplicação, por analogia, da Súmula 282/STF.
4. No tocante à indigitada violação do art. 36, III, da Lei n. 8.112/90 e à insurgência quanto ao dissídio na aplicação do dispositivo invocado, constata-se que a matéria foi solucionada com fundamento na teoria do fato consumado e necessidade de preservação da unidade familiar.
5. A ausência de impugnação quanto à preservação da família implica a incidência da Súmula 283/STF.
6. Ainda que assim não fosse, a extensão do comando que protege a família demandaria análise de dispositivo constitucional - art. 226 da CF -, o que é defeso na via especial.
7. Ausência de cotejo analítico entre o acórdão recorrido e os paradigmas invocados, nos moldes do art. 541 do CPC e 255 do RISTJ, a inviabilizar o acesso também pela alínea "c" do permissivo constitucional.
8. Agravo regimental a que se nega provimento (AgRg no AREsp. 445.860/MG, Segunda Turma, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 28.3.2014).
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PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO A PEDIDO. REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DA LEI 8.112/90. POSSIBILIDADE DE MITIGAÇÃO. SITUAÇÃO FÁTICA CONSOLIDADA.
1. Caso em que a agravante insurge-se contra o acórdão a quo que, em atenção à teoria do fato consumado, manteve a remoção, a pedido, do agravado.
2. A sentença que confirmou a antecipação dos efeitos da tutela e julgou procedente a ação ordinária para determinar a remoção do agravado foi proferida em 2001, ou seja, há mais de dez anos, razão pela qual, em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, deve ser mitigada a regra insculpida no art. 36, parágrafo único, III, da Lei 8.112/90. Precedentes: REsp 674.679/PE, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 5/12/2005; AgRg no Ag 1.021.232/RJ, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Quinta Turma, DJe 3/8/2009; e AgRg no REsp 854.555/TO, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Sexta Turma, DJe 3/8/2011.
3. Agravo regimental não provido (AgRg no Ag 1.397.693/SP, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 23.3.2012).
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ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. REMOÇÃO PARA ACOMPANHAR O CÔNJUGE. NÃO-ATENDIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 36, PARÁGRAFO ÚNICO, III, 'A', DA LEI 8.112/90. PECULIARIDADE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA HÁ MAIS DE 12 ANOS. PRESERVAÇÃO DA UNIDADE FAMILIAR. APLICAÇÃO DA TEORIA DO FATO CONSUMADO.
1. A situação fática está consolidada no tempo, haja vista que, por força de decisão antecipatória de tutela recursal, foi deferida, há mais de doze anos a remoção do servidor.
2. Em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a regra do art. 36, parág. único, III da Lei 8.112/90 deve ser mitigada no caso concreto, devendo ser aplicada a teoria do fato consumado.
3. A questão tratada nos autos foi decidida sem a necessidade de afastamento da norma jurídica por inconstitucionalidade, sendo, portanto, desnecessária a observância do que dispõe o art. 97 da Constituição Federal.
4. Agravo Regimental desprovido (AgRg no REsp. 854.555/TO, Rel. Min. conv. VASCO DELLA GIUSTINA, DJe 3.8.2011).
9. Este julgamento oportuniza uma nova reflexão, em bases humanísticas, que recupere o sentido protetivo que o Direito tinha nos seus primórdios. Como reconhece o Professor KARL ENGISCH (1899- 1990), aceitando que a histórica função judicial de apenas fazer as disposições legais incidirem nos julgamentos dos Juízes com a maior fidelidade possível aos seus comandos gerava uma constante tensão entre esse método jurídico (silogístico) e as exigências da justiça razoável.
10. Na sua opinião - seguida por numerosa corte de doutrinadores -, os limites entre a aplicação da lei e a sua correção são, nos casos concretos, certamente tão inseguros como muitas outras linhas divisórias, que, por razões metodológicas, precisamos traçar. A custo, será possível modificar algo neste ponto.
11. E o Mestre alemão anota que autores germânicos das décadas iniciais do Século XX, como HANS REICHEL e ERNST BELING, se posicionavam contra a aplicação de leis injustas e falavam, com notável antecipação doutrinária, de correção jurisprudencial das leis injustas.
12. Para o Jurista REICHEL, que escreveu nos idos de 1915, consoante pontua o Professor ENGISCH, o Juiz é obrigado, por força do seu cargo, a afastar-se conscientemente de uma disposição legal, quando essa disposição de tal modo contraria o sentimento ético da generalidade das pessoas que, pela sua observância, a autoridade do Direito e da Lei correria um perigo mais grave do que através da sua inobservância.
13. E prossegue o Professor KARL ENGISCH, lembrando que ERNST BELING afirmava, já em 1931, que o poder outorgado para criar direitos, que o legislador detém em suas mãos, não é um poder inteiramente ilimitado. O povo presume certas valorações como tão fundamentais, que o legislador não se acha autorizado a fixar normas que vão contra elas (Introdução ao Pensamento Jurídico. Tradução de J. Baptista Machado. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1965, p. 272).
14. Entretanto, em atenção à função uniformizadora desta Corte Superior, a qual, pela sua Primeira Seção, consolidou entendimento de que não há direito à remoção para acompanhar cônjuge em casos como o dos autos (EREsp 1.247.360/RJ, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 29.11.2017), dá-se provimento ao Agravo Regimental da União, com ressalva do ponto de vista do Relator. É o voto.