Inteiro teor - REsp 1381603

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.381.603 - MS (2013/0057876-1) RECORRENTE : ELIZABETH ALVES MORAIS ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL - DEFENSOR PÚBLICO RECORRIDO : ANA KARLA PELUFFO ZOHRAN GEORGES ADVOGADO : TEREZINHA SILVANA ARAÚJO ARRUDA - MS001249 RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 1. Ana Karla Peluffo Zohran Georges ajuizou ação monitória em face de Elizabeth Alves Morais, objetivando o recebimento do valor correspondente a R$ 9.307.63 (nove mil, trezentos e sete reais e sessenta e três centavos), ou, em não havendo o adimplemento voluntário da dívida, a conversão do pedido inicial em mandado executivo (fls. 2-10). Ocorrendo a citação por edital (fl. 56), a Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul, ao ser nomeada na qualidade de curadora especial, apresentou embargos monitórios (fls. 73-77). O Juízo de piso, analisando conjuntamente a petição inicial e a peça defensiva, julgou improcedente o pedido monitório (fls. 100-102). Interposta apelação (fls. 108-116), o Tribunal de origem, por maioria, deu provimento ao recurso (fls. 141-147), nos termos da ementa abaixo transcrita: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - PRELIMINAR - NULIDADE DA SENTENÇA SINGULAR EM VIRTUDE DA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - AFASTADA - MÉRITO - CORRESPONDÊNCIA ELETRÔNICA - DOCUMENTO HÁBIL A EMBASAR A PROPOSITURA DA AÇÃO MONITÓRIA - ARTIGO 1.102-A DO CPC - JUROS DE MORA - A PARTIR DA CITAÇÃO - CORREÇÃO MONETÁRIA - DESDE A DATA DO VENCIMENTO DA OBRIGAÇÃO - INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Apresentados embargos infringentes (fls. 152-159), a Corte local rejeitou o recurso, mantendo o acórdão anterior (fls. 179-183): EMBARGOS INFRINGENTES - AÇÃO MONITÓRIA - PROVA DOCUMENTAL HÁBIL CAPAZ DE PRESUMIR A EXISTÊNCIA DE UM DÉBITO - MENSAGEM ELETRÔNICA (EMAIL) - DOCUMENTO SUFICIENTE PARA ENSEJAR A PROPOSITURA DA AÇÃO MONITÓRIA - RECURSO IMPROVIDO. A prova escrita, dotada de aptidão e suficiênca para influir no livre convencimento motivado do juiz, deve ser considerada como documento hábil a instruir a ação monitória. Irresignada, Elizabeth Alves Morais interpõe recurso especial (fls. 187-209), com base nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, por ofensa ao art. 1.102-A do Código de Processo Civil de 1.973. Sustenta, ainda, a existência de dissídio jurisprudencial acerca da matéria controvertida. Argumenta, em síntese, que a correspondência eletrônica não se mostra título hábil a embasar a propositura da ação monitória, "haja vista a impossibilidade de certificação desse documento, o que acarreta a possibilidade de ter o seu conteúdo alterado ou mesmo inventado por qualquer um" (fls. 195-196). Assevera que, "no presente caso, a prova escrita que complementou a inicial da Ação Monitória consiste em mero e-mail, correspondência eletrônica, impresso pela própria Recorrida, autora da Ação, meio probatório que, isoladamente, não tem autenticidade e, portanto, não é merecedor de boa-fé" (fl. 196). Em relação ao dissídio pretoriano, traz julgados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (fls. 198-208). Não foram apresentadas contrarrazões ao recurso especial, consoante certidão de fl. 219. À fl. 251, dei provimento ao agravo para determinar a sua conversão em recurso especial, nos termos no art. 34, VII, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ). É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.381.603 - MS (2013/0057876-1) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO RECORRENTE : ELIZABETH ALVES MORAIS ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL - DEFENSOR PÚBLICO RECORRIDO : ANA KARLA PELUFFO ZOHRAN GEORGES ADVOGADO : TEREZINHA SILVANA ARAÚJO ARRUDA - MS001249 EMENTA RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. PROVA ESCRITA. JUÍZO DE PROBABILIDADE. CORRESPONDÊNCIA ELETRÔNICA. E-MAIL. DOCUMENTO HÁBIL A COMPROVAR A RELAÇÃO CONTRATUAL E A EXISTÊNCIA DE DÍVIDA. 1. A prova hábil a instruir a ação monitória, isto é, apta a ensejar a determinação da expedição do mandado monitório - a que alude os artigos 1.102-A do CPC/1.973 e 700 do CPC/2.015 -, precisa demonstrar a existência da obrigação, devendo o documento ser escrito e suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado acerca do direito alegado, não sendo necessário prova robusta, estreme de dúvida, mas sim documento idôneo que permita juízo de probabilidade do direito afirmado pelo autor. 2. O correio eletrônico (e-mail) pode fundamentar a pretensão monitória, desde que o juízo se convença da verossimilhança das alegações e da idoneidade das declarações, possibilitando ao réu impugnar-lhe pela via processual adequada. 3. O exame sobre a validade, ou não, da correspondência eletrônica (e-mail) deverá ser aferida no caso concreto, juntamente com os demais elementos de prova trazidos pela parte autora. 4. Recurso especial não provido. VOTO O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 2. Cinge-se a controvérsia em definir se a correspondência eletrônica - e-mail - constitui documento hábil a embasar a propositura de ação monitória. Na parte que interessa, o acórdão recorrido assim dispôs: No caso em questão, verifica-se que as transações comerciais realizadas entre as partes eram feitas por meio de mensagens eletrônicas, portanto, os documentos constantes da inicial devem ser consideradas provas escritas, sem eficácia de titulo executivo, a ensejar a propositura da ação monitória. Além disso, atualmente os emails tratam-se do meio mais utilizado para uma simples conversa entre amigos até a realização de algum negócio comercial. Portanto, evidencia-se que houve a compra de produtos, no valor de R$ 5.138,29 (cinco mil, cento e trinta e oito reais e vinte e nove centavos) e que a embargante se comprometeu em efetuar o pagamento da referida importância. Ademais, a ora embargante não se desincumbiu em provar a existência de fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito da ora embargada. Como bem destacado no voto vencedor: "(...). Com efeito, compulsando os autos e diante das considerações retrotranscritas, verifico que, de fato, os documentos colacionados são suficientes para ensejar a propositura de ação monitória. Digo isso mormente pelo fato de que não se mostra crível, em decorrência dos inúmeros veículos de comunicação disponíveis nos dias atuais e o ingresso na era digital, que se exclua a possibilidade de utilização como meio de prova uma confissão de dívida realizada por mensagens via correio eletrônico/e-mail. Além do mais, não se pode olvidar que a apelada não se desincumbiu, nos embargos monitórios, de comprovar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos de seu direito, ou seja, não cuidou ela de produzir alguma prova capaz de elidir a presunção de legitimidade dos documentos colacionados ao caderno probatório, consoante exige o artigo 333, II, do Estatuto Processual civil. Desta forma, conclui-se que, no caso em apreço, a apelante logrou êxito em demonstrar o ônus da prova do fato constitutivo do direito alegado na inicial CPC, art. 333, I, eis que produziu início de prova escrita a respeito da evidência do vínculo entre as partes, tal como estabelece o artigo 1.102-A do CPC. " [...] Deste modo, como o documento apresentado pela embargada é hábil, já que o próprio devedor afirma que o valor devido em email, pode ser constituído título executivo hábil, devendo prevalecer os votos prolatados pelo e. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso e Vladimir Abreu da Silva. Pelo exposto, conheço do recurso, mas nego-lhe provimento, devendo prevalecer os votos majoritários. [original sem grifos] 3. Com efeito, a ação monitória foi introduzida no ordenamento jurídico com a edição da Lei n. 9.079/1.995, que acrescentou os arts. 1.102-A, 1.102-B e 1.102-C ao Código de Processo Civil de 1.973, incluindo-o, portanto, como "procedimento especial de jurisdição contenciosa" (Livro IV, Título I). Por sua vez, a finalidade do procedimento monitório (ou injuntivo) é abreviar a formação do título executivo judicial, na hipótese em que o devedor não oferece resistência à pretensão do credor. Pode se referir à obrigação de pagar quantia em dinheiro, de entregar coisa fungível ou determinado bem móvel e, com base no novo CPC, também para buscar o adimplemento de obrigação de fazer ou de não fazer (art. 700, II, do CPC de 2.015). Há, como sabido, dois tipos de procedimento monitório: (a) o puro, que dispensa, para o ajuizamento da ação, o documento escrito, sem força executiva, bastando a palavra do autor afirmando ser credor; (b) o documental, cuja deflagração exige a presença de obrigação comprovada por documento escrito, sem força de título executivo. A par disso, é de fácil constatação que o CPC de 1.973 adotou a monitória documental. Apesar de a doutrina divergir quanto à natureza jurídica, Marcus Vinícius Rios Gonçalves entende que "a ação monitória é uma ação de conhecimento, de procedimento especial, porque, não havendo resistência do réu, constitui-se de pleno direito o título executivo judicial e passa-se à fase de execução" (GONÇALVES, Marcus Vinícius Rios. (coord. Pedro Lenza). Direito processual civil esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 918). Extrai-se do art. 1.102 do CPC/1.973 os requisitos para a propositura da ação monitória: comprovação da relação jurídica por meio de prova escrita; ausência de força executiva do título e dívida referente a pagamento de soma em dinheiro ou de entrega de coisa fungível ou bem móvel (vide também o art. 700 e incisos do CPC/2.015). Nesse passo, o legislador não definiu o termo "prova escrita", tratando-se, portanto, de conceito eminentemente doutrinário-jurisprudencial. Com efeito, a prova hábil a instruir a ação monitória, a que alude o artigo 1.102-A do Código de Processo Civil, não precisa, necessariamente, ter sido emitida pelo devedor ou nela constar sua assinatura ou de um representante. Basta que tenha forma escrita e seja suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado acerca do direito alegado. Essa é a lição da abalizada doutrina: 5. Prova documental: A petição inicial deverá vir instruída com a prova documental, podendo o autor apresentar dois ou mais documentos escritos, se a insuficiência de um puder ser suprida por outro; ou até mesmo se valer de documento proveniente de terceiro, desde que este e aqueles tenham aptidão para demonstrar a existência de uma relação jurídica material que envolva autor e réu e, ainda, para atestar a exigibilidade e a liquidez da prestação. Por outras palavras, deve ser considerado documento hábil, a respaldar a pretensão à tutela monitória, aquele produzido de forma escrita e dotado de aptidão e suficiência para influir na formação do livre convencimento do juiz acerca da probabilidade do direito afirmado pelo autor, como influiria se tivesse sido utilizado no processo de cognição plena. (MARCATO, Antonio Carlos (Org.). Código de Processo Civil Interpretado. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 2.645) [original sem grifos] Ademais, para a admissibilidade da ação monitória, não é imprescindível que o autor instrua a ação com prova robusta, estreme de dúvida, podendo ser aparelhada por documento idôneo, ainda que emitido pelo próprio credor, contanto que, por meio do prudente exame do juiz, exsurja juízo de probabilidade acerca do direito afirmado. Essa ideia do "juízo de probabilidade" é bem assente nesta Corte: __________ AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. PROVA ESCRITA SUFICIENTE. JUNTADA DE DOCUMENTOS APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DOS ÓBICES DESCRITOS NOS ENUNCIADOS N. 83/STJ E N. 283/STF. AGRAVO IMPROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Casa, nos termos do art. 1.102-A do Código de Processo Civil, basta a instrução da monitória prova escrita suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado. Assim, para a admissibilidade da ação monitória, não é necessária a apresentação de prova robusta, estreme de dúvida, sendo suficiente a presença de dados idôneos, ainda que unilaterais, desde que deles exsurja juízo de probabilidade acerca do direito afirmado. 2. Na espécie, a Corte Estadual, após exame da documentação colacionada pelo recorrido, afirmou que a petição inicial veio acompanhada de prova escrita e aparentemente idônea da obrigação. Incidência dos óbices descritos nos enunciados n. 83 /STJ e n. 283/STF. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1278643/ES, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/02/2016, DJe 29/02/2016) __________ AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ARTIGO 544 DO CPC) - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO DIRIGIDO CONTRA A REJEIÇÃO DE PRELIMINAR DE CARÊNCIA DA AÇÃO SUSCITADA NO BOJO DE EMBARGOS MONITÓRIOS - DECISÃO MONOCRÁTICA NEGANDO PROVIMENTO AO AGRAVO, MANTIDA A INADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DO RÉU DA AÇÃO MONITÓRIA. 1. Cabimento da ação monitória. 1.1. A prova hábil a instruir a ação monitória, a que alude o artigo 1.102-A do CPC, não precisa, necessariamente, ser robusta, podendo vir aparelhada por documento idôneo, ainda que emitido pelo próprio credor, contanto que, por meio do prudente exame do magistrado, exsurja o juízo de probabilidade acerca do direito afirmado. 1.2. Acórdão estadual que pugnou pela existência de prova escrita apta a autorizar o processamento da ação monitória. Necessidade do reexame do contexto fático-probatório dos autos para suplantar tal cognição. Incidência da Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 349.071/SE, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 01/06/2015) __________ PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. A DOCUMENTAÇÃO NECESSÁRIA PARA A ADMISSIBILIDADE TEM QUE SER IDÔNEA. APTA À FORMAÇÃO DO JUÍZO DE PROBABILIDADE ACERCA DO DIREITO AFIRMADO, A PARTIR DO PRUDENTE EXAME DO MAGISTRADO. 1. A prova hábil a instruir a ação monitória, a que alude o artigo 1.102-A do Código de Processo Civil não precisa, necessariamente, ter sido emitida pelo devedor ou nela constar sua assinatura ou de um representante. Basta que tenha forma escrita e seja suficiente para, efetivamente, influir na convicção do magistrado acerca do direito alegado. 2. Dessarte, para a admissibilidade da ação monitória, não é necessário que o autor instrua a ação com prova robusta, estreme de dúvida, podendo ser aparelhada por documento idôneo, ainda que emitido pelo próprio credor, contanto que, por meio do prudente exame do magistrado, exsurja o juízo de probabilidade acerca do direito afirmado pelo autor. 3. No caso dos autos, a recorrida, ao ajuizar a ação monitória, juntou como prova escrita sem eficácia de título executivo a própria nota fiscal do negócio de compra e venda de mercadorias, seguida do comprovante de entrega assinado e mais o protesto das duplicatas, que ficaram inadimplidas. A Corte local, após minucioso exame da documentação que instrui a ação, apurou que os documentos são suficientes para atender aos requisitos da legislação processual para cobrança via ação monitória, pois servem como início de prova escrita. A revisão desse entendimento, demanda o reexame de provas, vedado em sede de recurso especial (Súmula 7/STJ). 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 289.660/RN, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/06/2013, DJe 19/06/2013) __________ [originais sem grifos] Nessa linha argumentativa, confira-se a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, in verbis: A prova escrita não é a prova que deve fazer surgir direito líquido e certo, isto é, não é prova que deve demonstrar, por si só, o fato constitutivo do direito afirmado pelo autor. A prova escrita relaciona-se apenas a um juízo de probabilidade. Não há que se falar em certeza quando se está diante de prova escrita. Prova escrita não é sinônimo de prova que pode, por si só, demonstrar o fato constitutivo do direito. Quando se exige a prova escrita, como requisito para a propositura da ação monitória, não se pretende que o credor demonstre o seu direito estreme de dúvida, como se fosse um direito líquido e certo. Ao contrário, a prova escrita necessita fornecer ao juiz apenas certo grau de probabilidade acerca do direito alegado em juízo. MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Procedimentos especiais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 160). [original sem grifos] Por tais razões, não se admite a propositura da ação monitória baseada em prova testemunhal ou em meras afirmações feitas pelo autor da demanda. No ponto, não se pode olvidar que a lei de regência adotou o sistema da monitória documental. Por outro lado, da jurisprudência desta Corte Superior, é possível extrair um norte interpretativo acerca da amplitude da expressão "prova escrita", admitindo-se para as seguintes situações abaixo delineadas: a) documento que seja apto a demonstrar o direito à cobrança e ao convencimento da existência da dívida (REsp 866.205/RN, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/3/2014, DJe 6/5/2014); b) cheque prescrito (Súmula 299/STJ); c) nota promissória sem força executiva (Súmula 504/STJ); d) duplicata ou triplicata sem aceite (REsp 925.584/SE, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 9/10/2012, DJe 7/11/2012); e) nota fiscal, acompanhada da prova do recebimento da mercadoria ou da prestação de serviços (REsp 882.330/AL, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/5/2010, DJe 26/5/2010); f) contrato de abertura de crédito em conta-corrente, acompanhado do demonstrativo de débito (Súmula 247); g) contrato de arrendamento rural que estabelece pagamento em quantidade de produtos agrícolas (REsp 1.266.975/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/3/2016, DJe 28/3/2016); h) contrato de prestação de serviços educacionais (REsp 286.036/MG, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 15/2/2001, DJ 26/3/2001); i) guias de recolhimento da contribuição sindical e prova de notificação do devedor (REsp 765.029/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 6/8/2009, DJe 17/8/2009). A doutrina menciona ainda diversos outros exemplos: "(a) as anotações, na ficha própria dos trabalhos realizados pelo odontologista, acrescidos do valor unitário; (b) o velho caderno de armazém, em que as compras diárias da dona de casa são anotadas e liquidadas periodicamente; (c) o orçamento remetido ao endereço eletrônico do réu, acompanhado, senão da sua expressa concordância, ao menos da aceitação implícita, como a que decorre da eventual exigência de ajustes, subentendendo-se a entrega do serviço; e assim por diante" (ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de; ALVIM, Eduardo Arruda. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: GZ, 2012, p. 1.560). 4. Ademais, observa-se que, no atual estágio da sociedade, há uma forte tendência de diminuição de documentos produzidos em meio físico, reduzindo consideravelmente o uso do papel. Tal constatação também se mostra evidente no âmbito das relações comerciais, cujas tratativas são realizadas, em boa parte, por meio eletrônico, bastando lembrar os serviços bancários online (internet banking). Nesse contexto, nota-se que a legislação brasileira, ainda sob à luz do CPC de 1.973, não proíbe a utilização de provas oriundas de meio eletrônico. No ponto, o Código Civil de 2.002, em seu art. 225, preceitua que "As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão" (original sem grifos). Por oportuno, o enunciado n. 297, aprovado na IV Jornada de Direito Civil (CJF/STJ) destaca que "O documento eletrônico tem valor probante, desde que seja apto a conservar a integridade de seu conteúdo e idôneo a apontar sua autoria, independentemente da tecnologia empregada". Com essa mesma linha de raciocínio, veja-se o enunciado n. 298: "Os arquivos eletrônicos incluem-se no conceito de 'reproduções eletrônicas de fatos e coisa', do art. 225 do Código Civil, aos quais deve ser aplicado o regime jurídico da prova documental". Por sua vez, a Lei n. 11.419/2.006 permitiu uso de meio eletrônico na tramitação de processos judiciais e na comunicação de atos e transmissão de peças processuais, aplicando-se indistintamente aos procedimentos civis, penais e trabalhistas, em qualquer grau de jurisdição, bem como aos juizados especiais (art. 1º). Imbuído desse mesmo espírito da "era digital", o novo Código de Processo Civil, ao tratar sobre as provas admitidas no processo, possibilita expressamente o uso de documentos eletrônicos, condicionando, via de regra, a sua conversão na forma impressa: Art. 439. A utilização de documentos eletrônicos no processo convencional dependerá de sua conversão à forma impressa e da verificação de sua autenticidade, na forma da lei. Art. 440. O juiz apreciará o valor probante do documento eletrônico não convertido, assegurado às partes o acesso ao seu teor. Art. 441. Serão admitidos documentos eletrônicos produzidos e conservados com a observância da legislação específica. Acrescente-se, ainda, que a audiência de conciliação e mediação, assim como eventuais intimações, poderão ser realizadas com a utilização do meio eletrônico (arts. 183, § 1º, 334, § 7º, e 1.019, III, CPC/2.015). A titulo de exemplo dessa "tendência digital", a jurisprudência desta Corte Superior, após muitos embates, resolveu uma questão muito polêmica acerca do cabimento da comprovação do preparo mediante recibo extraído da internet. Assim, somente em meados do ano de 2015, ao julgar o Embargos de Divergência n. 423.679-SC, de relatoria do em. Ministro Raul Araújo, a Segunda Seção resolveu a controvérsia, passando a permitir o recibo oriundo do pagamento via internet. 5. Especificamente sobre a questão controvertida, é sabido que o correio eletrônico (e-mail, abreviatura de eletronic mail) é serviço que permite a troca de mensagens e arquivos por meio de sistemas de comunicações eletrônicas, a exemplo dos computadores, tablets e smartphones. As mensagens, enviadas com a utilização da internet, poderão consistir em textos, vídeos, áudios, imagens, entre outros. Patricia Peck Pinheiro esclarece que o "e-mail ou correio eletrônico é uma aplicação de rede de computadores, muito utilizado na Internet, que possibilita a troca de mensagens e arquivos entre os usuários. A palavra tem o significado literal de eletronic mail ou correio eletrônico" (PINHEIRO, Patricia Peck. Direito digital. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 173). Nesse sentido, a ilustre doutrinadora traz à baila as seguintes ponderações: O correio eletrônico, apesar de muito semelhante à correspondência, é um meio de comunicação com características próprias, como número de receptores da mensagem variável e do uso para o qual está sendo submetido, se pessoal, comercial ou publicitário. Seu conteúdo é disponibilizado na rede para que seus dados sejam enviados no sistema de pacotes aleatórios, utilizando vários caminhos. [...] É preciso entender melhor todas as peculiaridades desse tipo de comunicação, que hoje é cada vez mais uma via de negócios. (PINHEIRO, Patricia Peck. Direito digital. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 173) Quanto à sua força probante, o maior questionamento está adstrito ao campo da veracidade e da autenticidade das informações, principalmente sobre a propriedade de determinado endereço de e-mail. Em outras palavras, consiste em saber se uma "conta de e-mail" pertence às partes da demanda monitória, bem como se o seu conteúdo não foi alterado durante o tráfego das informações. Entretanto, há mecanismos capazes de garantir a segurança e a confiabilidade da correspondência eletrônica e a identidade do emissor, permitindo a trocas de mensagens criptografadas entre os usuários. É o caso do e-mail assinado digitalmente, com o uso de certificação digital. De acordo com o glossário da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, a assinatura digital é o "código anexado ou logicamente associado a uma mensagem eletrônica que permite de forma única e exclusiva a comprovação da autoria de um determinado conjunto de dados (um arquivo, um e-mail ou uma transação)". Por sua vez, o certificado digital é o "conjunto de dados de computador, gerados por uma Autoridade Certificadora, em observância à Recomendação Internacional ITU-T X.509, que se destina a registrar, de forma única, exclusiva e intransferível, a relação existente entre uma chave de criptografia e uma pessoa física, jurídica, máquina ou aplicação" (disponível em . Acesso em 29/9/2016, às 16:20hs). Inclusive essa questão já foi abordada no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial n. 1.347.278-RS (DJe 1º/8/2013), de minha relatoria, apreciado pela Corte Especial, consoante a ementa abaixo transcrita: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADVOGADO TITULAR DO CERTIFICADO DIGITAL SEM PROCURAÇÃO NOS AUTOS. DESCUMPRIMENTO DA LEI 11.419/2006 E DA RESOLUÇÃO N. 1/2010, DA PRESIDÊNCIA DO STJ. IRRELEVÂNCIA, NO ENTANTO, DA AUSÊNCIA DE MENÇÃO DO NOME DO SIGNATÁRIO DIGITAL NA PETIÇÃO REMETIDA ELETRONICAMENTE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A prática eletrônica de ato judicial, na forma da Lei n. 11.419/2006, reclama que o titular do certificado digital utilizado possua procuração nos autos, sendo irrelevante que na petição esteja ou não grafado o seu nome. 2. A assinatura digital destina-se à identificação inequívoca do signatário do documento, o qual passa a ostentar o nome do detentor do certificado digital utilizado, o número de série do certificado, bem como a data e a hora do lançamento da firma digital. Dessa sorte, o atendimento da regra contida na alínea a do inciso III do parágrafo 2º do artigo 1º da Lei n. 11.419/2006 depende tão somente de o signatário digital possuir procuração nos autos. Precedente da 3ª Turma: EDcl no AgRg nos EDcl no AgRg no Ag 1.234.470/SP, Rel. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 10/04/2012, DJe de 19/04/2012. 3. Ademais, o parágrafo 2º do art. 18 da Res. 1/2010, da Presidência do STJ preconiza que "o envio da petição por meio eletrônico e com assinatura digital dispensa a apresentação posterior dos originais ou de fotocópias autenticadas". 4. Na espécie, porém, o titular do certificado digital utilizado para a assinatura digital da petição do agravo regimental não possui procuração nos autos, conforme atestado pela Coordenadoria da Quarta Turma. 5. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1347278/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/06/2013, DJe 01/08/2013) [original sem grifos] Quanto ao cerne da questão em julgamento, penso que esse exame sobre a validade, ou não, da correspondência eletrônica deverá ser aferida no caso concreto, juntamente com os demais elementos de prova trazidos pela parte autora. Outrossim, uma vez recebida a petição inicial, o e-mail poderá ser submetido ao crivo do contraditório diferido, na hipótese em que o réu optar por apresentar os embargos monitórios. De fato, se a legislação brasileira não veda a utilização de documentos eletrônicos como meio de prova, soaria irrazoável dizer que uma relação negocial não possa ser comprovada por trocas de mensagens via e-mail. Ressalta-se que, ainda nos idos de 2008, a Terceira Turma, em voto da relatoria da em. Ministra Nancy Andrighi, assentou que "os avanços tecnológicos vêm, gradativamente, modificando as rígidas formalidades processuais anteriormente exigidas" (REsp 1.073.015/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 26/11/2008). No ponto, rememore-se a redação do art. 332 do CPC de 1.973: "todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa" (original sem grifos). Com esse mesmo raciocínio é o art. 369 do Código de Processo Civil de 2015: "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz" (original sem grifos). O já citado art. 225 do Código Civil de 2.002 também permite que quaisquer reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou coisas possam fazer prova plena contra quem forem exibidos, no caso de não haver impugnação. Todavia, como se disse, a dúvida que pode surgir sobre a autenticidade do correio eletrônico deve ser avaliada pelo magistrado no exame do caso concreto, cabendo ao demandado, se assim o quiser, apresentar os embargos para questionar a idoneidade dos e-mails utilizados pelo autor para sustentar a existência da relação jurídica e o eventual inadimplemento da obrigação. Nota-se, ainda, que a incerteza sobre a validade de determinada prova não é exclusiva dos documentos eletrônicos, pois um suposto instrumento contratual impresso em papel, mesmo que assinado por qualquer das partes, também pode ter sua eficácia questionada pela parte contrária, permitindo, inclusive, a instauração de incidente de falsidade. Também nada impede que o magistrado indefira a petição inicial se entender que os e-mails apresentados, com ou sem a juntada de outros documentos, não preenchem o requisito do art. 283 do CPC de 1.973, isto é, não constituam "documentos indispensáveis à propositura da ação". Nesse aspecto, o novo CPC determina a intimação para a emenda à inicial (art. 700, § 5º, CPC/2.015). Essa linha de raciocínio é compartilhada por Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, quando asseveram que "qualquer escrito particular, ainda que não reconhecido - não importando se expresso mediante carta, telegrama, fax ou mensagem eletrônica (e-mai) - constitui prova escrita". (MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. Procedimentos especiais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 161) (original sem grifos). Assim, diante desses fundamentos, entendo que o correio eletrônico (email) pode fundamentar a pretensão monitória, desde que o juízo se convença da verossimilhança das alegações e da idoneidade das declarações, possibilitando ao réu impugnar-lhe pela via processual adequada. De outra banda, deve ser observado o CPC de 2.015, no § 5º, do art. 700, segundo o qual, havendo dúvida sobre a idoneidade da prova documental apresentada pelo autor, o magistrado intimá-lo-á para, querendo, emendar a petição e adaptá-la ao procedimento comum. 6. No caso concreto, a ora recorrente (ré) encaminha correspondência eletrônica à ora recorrida com o seguinte conteúdo (fls. 12-14), in verbis: Oi Ana, tudo bem? Não tive condições de fazer nenhum acerto com você antes pois estou atravessando um momento muito complicado, com sérios problemas familiares, além de outros... Não quero me justificar, pois vc não tem nada com isso. Só quero te dizer que lamento que tudo que tenha acontecido dessa forma e se não te liguei antes e nem estou ligando agora é para me poupar um pouco, pois vc, com razão iria cobrar e eu estou demasiadamente fragilizada para ouvir críticas. [...] Os produtos que vc comprou (2.500 PV = R$ 5.138,29) e que eu comprometi em te passar o dinheiro, quero que vc considere os juros da sua aplicação, ou outro que achar justo e conveniente para que eu possa ir te pagando. Farei os depósitos o mais rápido que conseguir. Em novo email, a recorrente (ré) apresenta os seguintes esclarecimentos: Oi Ana, Desculpe não ter retornado hj, mas estive ministrando curso para Nutricionistas aqui em casa o muito tarde para te ligar (sic). [...] Amanhã pela manhã e a tarde também estarei envolvida com as nutricionistas. Temos que equipar ainda. [...] E eu estarei viajando amanhã a noite para São José do Rio Preto e para São Paulo para o STS de 1 tem abaixo de mim. Sendo assim, creio que será praticamente impossível fazermos ao nosso acerto dessa sua vinda aqui. [...] Desculpe não ter te ligado e não poder te dar a atenção que vc merece. Aguardo seu retorno. Um abraço, Bete. Ademais, a partir da fl. 23 consta planilha de acerto de contas, enviada pela parte ré - ora recorrente, como anexo às correspondências eletrônicas acima aludidas. Por sua vez, em sede de embargos monitórios (fls. 73-77), a ora recorrente apenas se limitou a suscitar a nulidade da citação por edital e, sem juntar nenhum documento que colocasse em dúvida as alegações da autora, afirmou genericamente que os elementos que instruem os autos não se prestam a justificar o procedimento monitório, in verbis: [...] Assim, referida citação por edital não cumpriu as exigência do art. 231 do Código de Processo Civil, pois o citado não se encontra em lugar ignorado, incerto e tampouco inacessível. Portanto, supracitado artigo não foi observado, devendo a citação por edital ser anulada. [...] A inicial não apresenta nenhum elemento de prova das partes haverem realizado qualquer negócio jurídico, sendo o ônus de sua prova exclusivo da autora - os supostos email não vinculam a requerida a qualquer responsabilidade, nem mesmo há algum documento escrito emitido ou assinados pela ré que seja hábil a amparar o suposto direito de crédito da autora. Incide, portanto, o art. 225 do Código Civil de 2.002: "As reproduções fotográficas, cinematográficas, os registros fonográficos e, em geral, quaisquer outras reproduções mecânicas ou eletrônicas de fatos ou de coisas fazem prova plena destes, se a parte, contra quem forem exibidos, não lhes impugnar a exatidão". Acrescente-se, ainda, como bem lançado pelo acórdão recorrido, que "a apelada [ora recorrente] não se desincumbiu, nos embargos monitórios, de comprovar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos de seu direito, ou seja, não cuidou ela de produzir alguma prova capaz de elidir a presunção de legitimidade dos documentos colacionados ao caderno probatório, consoante exige o artigo 333, II, do Estatuto Processual Civil de 1.973. Com base nisso, a meu sentir, os documentos juntados aos autos demonstram a configuração do negócio jurídico entabulado pelas partes, a existência da dívida decorrente da confissão feita pela recorrente e o valor total da obrigação. Some-se a isto que a recorrente não apresentou documentos capazes de colocar em dúvida a autenticidade e a veracidade do conteúdo dos e-mails. Dessa forma, na linha de entendimento esposado pelo acórdão recorrido, merece ser mantida a procedência do pedido monitório. 7. Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial. É como voto.