AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1.303.337 - SE (2012/0003000-4)
RELATÓRIO
MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES: Trata-se de Agravo interno, interposto pelo MUNICÍPIO DE ARACAJU, em 12/03/2018, contra decisão de minha lavra, publicada em 21/02/2018, assim fundamentada, in verbis:
"Trata-se de Agravo, interposto pelo MUNICÍPIO DE ARACAJU, em 16/07/2014, contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, que inadmitiu o Recurso Especial manejado em face de acórdão assim ementado:
'APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LOTEAMENTO DE SOLO URBANO - AUSÊNCIA DE APROVAÇÃO DE PROJETO DE INFRA-ESTRUTURA JUNTO AO MUNICÍPIO DE ARACAJU E FALTA DE REGISTRO DO EMPREENDIMENTO NO CARTÓRIO IMOBILIÁRIO COMPETENTE PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO REJEITADAS - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL - INSUBSISTÊNCIA - PREVISÃO LEGAL DA 'RESERVA DE CONTIGÊNCIA', CONSOANTE DISPÕE O ART. 5º, INCISO III, DA LEI FEDERAL Nº 101/2000 - DEVER DO MUNICÍPIO EM GERIR PELO BEM ESTAR SOCIAL - INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO SEPARAÇÃO DOS PODERES - DEVER DO MUNICÍPIO EM CUMPRIR AS POLÍTICAS PÚBLICAS - CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO DE ARACAJU EM DESPESAS PÚBLICAS - POSSIBILIDADE - APENAS CONCEDE-SE AO MUNICÍPIO PRAZO DIFERIDO PARA O PAGAMENTO DAS CUSTAS, POSTERGANDO-SE PARA O FINAL DA DEMANDA - ASTREINTES CONTRA FAZENDA PÚBLICA - INCIDÊNCIA, TODAVIA LIMITANDO-SE O VALOR TOTAL EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS) - IMPROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA EMURB E PARCIAL PROVIMENTO DO MANEJADO PELO MUNICÍPIO DE ARACAJU - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE - UNÂNIME' (fl. 492e).
O acórdão em questão foi objeto de Embargos de Declaração, rejeitados nos seguintes termos:
'EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OMISSÃO NO JULGADO - INEXISTÊNCIA - A MATÉRIA ORA DEDUZIDA NOS EMBARGOS FOI EXAMINADA E DECIDIDA NO ACÓRDÃO, COM FUNDAMENTOS PRECISOS, ENFRENTANDO TODAS AS QUESTÕES INVOCADAS NO RECURSO - RECURSO IMPROVIDO - UNÂNIME' (fls. 528e).
Aponta a parte agravante, nas razões do Recurso Especial, que houve a ofensa ao art. 535, II, do CPC/73, pois, 'malgrado o pedido do Município de Aracaju, em sede de embargos de declaração, tenha sido para que a Corte Estadual se manifestasse expressamente acerca da violação ao art. 3° do CPC/73, manteve-se a omissa sobre o exame da matéria' (fl. 577e)
Sustenta que 'a legitimidade para fazer parte da relação jurídica processual é umas das condições da ação, conforme preceitua o art. 3° do CPC/73', logo, 'se a Administração Direta não é responsável pelo cumprimento de deveres relacionados à questão urbanística, logicamente não é parte legítima para figurar na relação jurídica processual' (fl. 583e).
Requer, ao final, o provimento do Recurso Especial, 'para que seja determinado ao e. Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe o pronunciamento expresso sobre a violação ao art. 3° do CPC/73' e, caso contrário, 'pugna a Municipalidade pela reforma da decisão vergastada, no sentido de que seja declarada a ilegitimidade passiva ad causam do Município cie Aracaju' (fl. 587e).
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 593/599e).
Negado seguimento ao Recurso Especial (fls. 624/630e), foi interposto o presente Agravo (fls. 653/659e).
O Ministério Público Federal, em parecer de fls. 688/693e, opina pelo improvimento do Agravo.
A irresignação não merece acolhimento.
Em relação ao art. 535 do CPC, deve-se ressaltar que o acórdão recorrido, julgado sob a égide do CPC/73, não incorreu em omissão, uma vez que o voto condutor do julgado apreciou, fundamentadamente, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida pela parte recorrente.
Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, AgRg no AREsp 408.492/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 24/10/2013; STJ, AgRg no AREsp 406.332/MS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 14/11/2013; STJ, AgRg no REsp 1360762/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/09/2013.
No mais, o Tribunal local assentou que 'incumbe ao Município gerenciar e fiscalizar as obras de ocupação do seu solo urbano, ao passo que a Emurb incumbe a execução dessa obras, motivo porque, em se tratando de uma Ação que tem por objetivo a legalização de um loteamento de solo urbano, não restam dúvidas acerca da legitimidade passiva dos apelantes' (fl. 497e).
Com efeito, o entendimento do acórdão recorrido não diverge da jurisprudência desta Corte, firmado no sentido de que o ente municipal é responsável pela inexecução da obra de infra-estrutura. Nesse sentido:
'PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LOTEAMENTO IRREGULAR. FISCALIZAÇÃO. PODER-DEVER DO MUNICÍPIO. PRECEDENTES.
1. De acordo com a jurisprudência desta Corte, o Município tem o poder-dever de agir para fiscalizar e regularizar loteamento irregular, pois é o responsável pelo parcelamento, uso e ocupação do solo urbano, atividade essa que é vinculada, e não discricionária.
2. Não merece prosperar o argumento de que o mencionado entendimento jurisprudencial somente diz respeito à Constituição do Estado de São Paulo, eis que o art. 40 da Lei Federal 6.766/79 foi efetivamente analisado por esta Corte ao firmar o entendimento.
3. Agravo regimental a que se nega provimento' (STJ, AgRg no AREsp 109.078/AC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 25/08/2016).
'ADMINISTRATIVO. LOTEAMENTO. REGULARIZAÇÃO. ART. 40 DA LEI 6.766/1979. ESTATUTO DA CIDADE. DEVER MUNICIPAL. LIMITAÇÃO ÀS OBRAS ESSENCIAIS.
1. Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul contra o Município de Soledade visando à regularização de loteamento urbano a fim de adequá-lo à legislação nacional, estadual e municipal, com a realização de obras de infraestrutura e a reparação do dano ambiental existente.
2. Em primeiro grau, o pedido foi julgada improcedente.
3. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul deu provimento ao apelo para reconhecer a responsabilidade do Município de Soledade pela regularização do loteamento com as seguintes restrições: 'regularização quanto a (1) vias de circulação; (2) escoamento de águas pluviais; (3) rede de abastecimento de água potável; (4) rede de energia elétrica, inclusive domiciliar; e (5) esgoto sanitário'.
4. Não é possível afastar peremptoriamente a responsabilidade do Município, devendo esse ser condenado a realizar somente as obras essenciais a serem implantadas, em conformidade com a legislação urbanística local (art. 40, § 5º, da Lei Lehmann).
5. Existe o poder-dever do Município, mas a sua atuação deve se restringir às obras essenciais a serem implantadas, em conformidade com a legislação urbanística local (art. 40, § 5º, da Lei 6.799/79), em especial à infraestrutura necessária para inserção na malha urbana, como ruas, esgoto, energia e iluminação pública, de modo a atender aos moradores já instalados, não havendo esse dever em relação a parcelas do loteamento irregular ainda não ocupadas, sem prejuízo do também dever-poder a Administração de cobrar dos responsáveis os custos em que incorrer na sua atuação saneadora.
6. Recurso Especial não provido' (STJ, REsp 1.594.361/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2016).
Destarte, aplica-se, ao caso, entendimento consolidado na Súmula 568/STJ, in verbis: 'O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema'.
Em face do exposto, com fundamento no art. 253, parágrafo único, II, b, do RISTJ, conheço do Agravo para negar provimento ao Recurso Especial.
Deixo de majorar os honorários recursais, tendo em vista que o Recurso Especial foi interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/73, tal como dispõe o Enunciado administrativo 7/STJ ('Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC')" (fls. 700/703e).
Inconformada, sustenta a parte agravante que:
"Por não ter havido o provimento dos embargos de declaração opostos pelo Município de Aracaju, nem mesmo ter ocorrido a manifestação expressa e explícita acerca da apontada violação ao art. 3º do CPC/73, percebe-se, claramente, que o e. Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe foi de encontro ao art. 535, II do Código de Processo Civil, cujo teor do dispositivo legal vai abaixo trasncrito:
(...)
Por outro lado, em que pese o e. TJ/SE afirmar, no trecho retrotranscrito, peremptoriamente, que a matéria foi prequestionada, é cediço que o e. Superior Tribunal de Justiça não admite o prequestionamento ficto, devendo então o Município de Aracaju se quiser ver o seu Recurso Especial por violação ao art. 3º do CPC/73 conhecido, em primeiro lugar, interpor Recurso Especial por violação ao art. 535 do CPC/73.
(...)
Deveras, pugna a Municipalidade, no Tribunal de Justiça e na Corte Superior, que seja determinado ao Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe a respectiva manifestação expressa acerca da violação ao art. 3º do CPC/73, respeitando, por conseguinte, o inc. II do art. 535 do CPC/73. (atualmente arts. 17, 1022, parágrafo único, inciso II e art. 489, § 1º do NCPC)
Com efeito, malgrado o pedido do Município de Aracaju, em sede de Embargos de declaração, tenha sido para que a Corte Estadual se manifestasse expressamente acerca da violação ao art. 3º do CPC/73, manteve-se a omissa sobre o exame da matéria.
Sendo assim, basta uma simples leitura do supracitado acórdão para se perceber que, a despeito de provocação da Municipalidade, o d. Juízo não se manifesta sobre a violação ao art. 3º do CPC.
Sendo assim, caso o Município de Aracaju não promovesse a interposição, em um primeiro momento, de RESP por violação ao art. 535 do CPC/73, preferindo, ao contrario, de logo, atacar a violação ao art. 3º do CPC/73, não teria seu recurso conhecido, na medida em que o STJ não admite o prequestionamento ficto.
(...)
Conforme foi dito na petição do agravo de instrumento, no exercício da competência que lhe foi constitucionalmente conferida, e no âmbito da discricionariedade inerente ao desenvolvimento dos atos administrativos, decidiu o Poder Público Municipal delegar expressamente à EMURB a atribuição para gerir as questões referentes à fiscalização urbanística, bem como tratar de questões relacionadas à construção de empreendimentos.
(...)
Deveras, quem deve, no Município de Aracaju, promover a implantação e fiscalização de planos urbanísticos, com todos os seus consectários, é a EMURB (Empresa Municipal de Obras e Urbanização).
(...)
Foi este o objetivo perseguido pelo presente recurso especial, obter, por meio do retorno dos autos ao Tribunal sergipano, o devido pronunciamento que possibilitará, ao Município, propor os recursos especial e extraordinário cabíveis, referente ao confronto entre a legislação pátria (afinal a solidariedade não se presume), bem como a regra constitucional (que autoriza a existência da Administração Indireta) e o acórdão, que enfrente a legislação local e as questões fáticas" (fls. 723/730e).
Por fim, requer "que o presente Agravo Regimental (Art. 259, caput, RISTF) seja conhecido e provido, de modo a permitir que o recurso especial, de igual modo, seja conhecido e provido" (fl. 730e).
Impugnação da parte agravada, a fls. 736/739e, pelo não conhecimento ou improvimento do recurso.
É o relatório.
AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1.303.337 - SE (2012/0003000-4)
VOTO
MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES (Relatora): De início, como se observa por simples leitura das razões do presente Agravo, deixou a parte agravante de infirmar a decisão agravada, no ponto relativo à responsabilidade do ente municipal pela inexecução da obra de infra-estrutura.
Assim, interposto Agravo interno com razões deficientes, que não impugnam, especificamente, os fundamentos da decisão agravada, constitui óbice ao conhecimento do inconformismo, no particular, a Súmula 182 desta Corte.
Nesse sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PRELIMINAR DE NULIDADE DO PROCESSO. FALTA DE CIÊNCIA AO ÓRGÃO DE REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DA PESSOA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA 182 DO STJ.
(...)
2. No presente Regimental, a parte agravante não impugnou os fundamentos da decisão recorrida, limitando-se a reafirmar as razões de seu Recurso Especial.
3. A falta de impugnação específica de todos os fundamentos da decisão agravada inviabiliza o conhecimento do Agravo Regimental. Incide a Súmula 182/STJ: 'É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada.'
4. Agravo Regimental não conhecido" (STJ, AgRg no REsp 1.425.186/MS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 27/03/2014).
No mais, não obstante os combativos argumentos da parte agravante, as razões deduzidas neste Agravo interno não são aptas a desconstituir os fundamentos da decisão atacada, que merece ser mantida.
Na origem, trata-se de Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Sergipe, objetivando sejam os réus condenados a regularizar o Loteamento Indara, a fim de promover a aprovação do loteamento, contendo desenhos, memoriais descritivos e cronograma de execução de obras de infra-estrutura necessários à urbanização do aludido loteamento.
Na sentença, o Juízo de 1º Grau julgou parcialmente procedente a demanda (fls. 387/398e).
O Tribunal local, por sua vez, deu parcial provimento ao apelo do Município de Aracaju, somente para limitar as astreintes, fixando o valor máximo de R$10.000,00 (dez mil reais), mantendo os demais termos da sentença, in verbis:
"Ambos os apelantes suscitam a sua ilegitimidade passiva para figurar no pólo passivo da demanda.
Entretanto, carecem de razão ambos os insurgentes.
Como se sabe, incumbe ao Município gerenciar e fiscalizar as obras de ocupação do seu solo urbano, ao passo que a Emurb incumbe a execução dessa obras, motivo porque, em se tratando de uma Ação que tem por objetivo a legalização de um loteamento de solo urbano, não restam dúvidas acerca da legitimidade passiva dos apelantes.
Ressalte-se que o fato de ter uma pessoa física responsável pelas vendas dos lotes, não afasta a responsabilidade das apelantes, já que, cada uma deve agir dentro do seu âmago de função, a fim de proceder a uma integração de ações, que possam convergir a finalidade esperada em um Loteamento Urbano.
Ademais, a própria Constituição Federal, em seu art. 182 imputa ao Poder Público Municipal a gerência de política e desenvolvimento urbano, para garantir o bem estar de seus habitantes, assim como a própria Lei Orgânica Municipal, em seu art. 19, inciso XXVIII estabelece a responsabilidade pela fiscalização e autorização de obras à EMURB e ao ente Municipal.
Portanto, não há que se imputar a responsabilidade unicamente ao empreendedor.
Também carecem de razão os apelantes quando alegam a impossibilidade jurídica do pedido.
Sabe-se que o ordenamento jurídico vigente somente veda a apreciação dos pedidos juridicamente impossíveis, ilegais ou imorais, o que não vem a ser o caso dos autos.
Ao contrário, trata-se o caso de estruturação de Loteamento urbano, o que incide em verdadeira tentativa de encartar o terreno em questão nos padrões normais de urbanização, de modo a atingir a função social da propriedade.
Ambos os apelantes também se insurgem em relação condenação imposta no item b da sentença, aduzindo que não houve pedido de outorga de escrituras definitivas dos lotes aos adquirentes.
Entretanto, num pleito em que se busca a regularização do loteamento, não deixa de ser uma conseqüência lógica a transcrição da propriedade aos adquirentes, o que, inclusive, foi manifestado pelo Ministério Público em seu pleito do item d.
Apesar de não ter sido feito este pedido alusivo aos ora apelantes, a douta sentença, com o fim de dar a maior efetividade ao objetivo principal da ação, qual seja, regularização do loteamento, condenou todos os requeridos solidariamente a esta penalidade, já que sem a ação da Emurb e do Município de Aracaju, que são os responsáveis primeiros pelos trâmites alusivos à transcrição dos lotes, o loteador ficaria impossibilitado de proceder à sua obrigação.
(...)
Assim, conclui-se que a função jurisdicional, no presente caso, não está a invadir esfera do Poder Executivo, mas tão somente zelando pelo bem estar social, garantido constitucionalmente.
(...)
Em relação a impossibilidade de multa diária contra a Fazenda Pública, sabe-se que esta questão já se encontra pacificada nas jurisprudências do nosso país, inclusive deste Tribunal, como a seguir se transcreve:
(...)
Em relação ao quantum fixado, entendo que o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) afigura-se em consonância com o princípio da razoabilidade, apto a fazer cumprir a função das astreintes, que é justamente compelir os obrigados ao implemento da obrigação.
Todavia, entendo que esse valor deve ser limitado ao total de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
No tocante à isenção do pagamento das custas processuais, temos que a Fazenda Pública Municipal goza tão somente do privilégio do diferimento das custas processuais em relação aos demais, por lhe ser permitido o pagamento ao final do processo, se vencido, mas não a sua isenção.
Por fim, em relação à ofensa à reserva do possível, sabe-se que consta na Lei de Responsabilidade Fiscal a chamada reserva de contingência (art. 5º, inciso III, da Lei Federal no 101/2000) em que a Fazenda Pública, nos casos de pagamentos não previstos no orçamento, deverá utilizar os valores reservados na Lei de Diretrizes Orçamentárias" (fls. 497/500e).
Opostos Embargos Declaratórios, restaram rejeitados (fls. 526/540e).
Nas razões do Recurso Especial, a parte recorrente alega ofensa ao art. 535, II, do CPC/73, pois, "malgrado o pedido do Município de Aracaju, em sede de embargos de declaração, tenha sido para que a Corte Estadual se manifestasse expressamente acerca da violação ao art. 3° do CPC/73, manteve-se a omissa sobre o exame da matéria" (fl. 577e).
Sustenta que "a legitimidade para fazer parte da relação jurídica processual é umas das condições da ação, conforme preceitua o art. 3° do CPC/73", logo, "se a Administração Direta não é responsável pelo cumprimento de deveres relacionados à questão urbanística, logicamente não é parte legítima para figurar na relação jurídica processual" (fl. 583e).
Sem razão, contudo.
Conforme consta da decisão agravada, acerca da legitimidade passiva do recorrente registrou o acórdão recorrido:
"Ambos os apelantes suscitam a sua ilegitimidade passiva para figurar no pólo passivo da demanda.
Entretanto, carecem de razão ambos os insurgentes.
Como se sabe, incumbe ao Município gerenciar e fiscalizar as obras de ocupação do seu solo urbano, ao passo que a Emurb incumbe a execução dessa obras, motivo porque, em se tratando de uma Ação que tem por objetivo a legalização de um loteamento de solo urbano, não restam dúvidas acerca da legitimidade passiva dos apelantes.
Ressalte-se que o fato de ter uma pessoa física responsável pelas vendas dos lotes, não afasta a responsabilidade das apelantes, já que, cada uma deve agir dentro do seu âmago de função, a fim de proceder a uma integração de ações, que possam convergir a finalidade esperada em um Loteamento Urbano.
Ademais, a própria Constituição Federal, em seu art. 182 imputa ao Poder Público Municipal a gerência de política e desenvolvimento urbano, para garantir o bem estar de seus habitantes, assim como a própria Lei Orgânica Municipal, em seu art. 19, inciso XXVIII estabelece a responsabilidade pela fiscalização e autorização de obras à EMURB e ao ente Municipal.
Portanto, não há que se imputar a responsabilidade unicamente ao empreendedor" (fls. 497/498e).
De plano, à luz do que decidido pelo acórdão recorrido, cumpre asseverar que, ao contrário do que ora se sustenta, não houve violação ao art. 535, II, do Código de Processo Civil de 1973, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do acórdão proferido em sede de Embargos de Declaração apreciaram, fundamentadamente e de modo completo, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida.
Assim, "a solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC" (STJ, AgInt no AgInt no AREsp 867.165/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 19/12/2016).
Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. Nesse sentido: STJ, REsp 801.101/MG, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 23/04/2008.
A propósito, ainda:
"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS.
1. Não há violação ao art. 535 do CPC quando a prestação jurisdicional é dada na medida da pretensão deduzida e a decisão está suficientemente fundamentada.
(...)
Agravo regimental improvido" (STJ, AgRg no AREsp 433.424/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/02/2014).
Ademais, não cabem Declaratórios com objetivo de provocar prequestionamento, se ausentes omissão, contradição ou obscuridade no julgado (STJ, AgRg no REsp 1.235.316/RS, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, PRIMEIRA TURMA, DJe de 12/05/2011), bem como não se presta a via declaratória para obrigar o Tribunal a reapreciar provas, sob o ponto de vista da parte recorrente (STJ, AgRg no Ag 117.463/RJ, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, DJU de 27/10/1997).
Assim, merece ser mantida a decisão ora agravada, por seus próprios fundamentos.
Ante o exposto, conheço, em parte, do Agravo interno, e, nessa parte, nego-lhe provimento.
É o voto.