AgRg no HABEAS CORPUS Nº 696.388 - SC (2021/0310236-4)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
AGRAVANTE : DEOLINDO FERREIRA DOS SANTOS
ADVOGADOS : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS:
Trata-se de agravo regimental contra decisão que não conheceu do habeas corpus anteriormente impetrado em favor de DEOLINDO FERREIRA DOS SANTOS (e-STJ, fls. 478-482).
Neste recurso, a defesa reitera os argumentos expostos na inicial, ressaltando que, ?na espécie, o juízo sentenciante, como se verifica, substituiu a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, dispensando qualquer fundamentação concreta que justificasse a negativa da aplicação das sanções mais benéficas, tendo o Tribunal de origem corroborado com tal entendimento, incorrendo também, pois, em ilegalidade? (e-STJ, fl. 491).
Sustenta que, não tendo sido apresentada fundamentação concreta e válida, é imperativa a aplicação da pena mais favorável ao paciente, qual seja, a substituição da reprimenda por uma multa e uma pena restritiva de direitos.
o agravante aportou aos autos os elementos que comprovam sua inocência, não sendo razoável que se requeira do acusado a comprovação da adulteração de sinal identificador do veículo por outrem, a fim de afastar sua autoria.
Neste contexto, requer a reconsideração do decisum ou que o agravo seja submetido à apreciação do colegiado, para que seja concedida a ordem, a fim de reformar a decisão monocrática, para que seja substituída a pena privativa de liberdade imposta ao agravante por uma restritiva de direitos e uma de multa, na forma do art. 44. § 2º, do Código Penal.
É o relatório.
AgRg no HABEAS CORPUS Nº 696.388 - SC (2021/0310236-4)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
AGRAVANTE : DEOLINDO FERREIRA DOS SANTOS
ADVOGADOS : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
EMENTA
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR. DOSIMETRIA. PENA CORPORAL SUBSTITUÍDA POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. PLEITO DE SUBSTITUIÇÃO POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS E MULTA. DESPROPORCIONALIDADE NÃO EVIDENCIADA. MULTA PREVISTA CUMULATIVAMENTE NO PRECEITO SECUNDÁRIO DO TIPO PENAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE INEXISTENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Assim, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e dos critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, por exigirem revolvimento probatório.
2. O art. 44, § 2º, segunda parte, do Código Penal prevê a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade, nas condenações superiores a 1 ano, por duas restritivas de direitos ou por uma restritiva de direitos e multa, cabendo ao Magistrado processante, de forma motivada, eleger qual medida é mais adequada ao caso concreto.
3. Salvo se evidenciada manifesta desproporcionalidade, o que não se infere na hipótese ora analisada, deve ser mantida a pena restritiva de direitos imposta ao réu. Além disso, maiores incursões sobre o tema exigiriam revolvimento detido do conjunto fático-comprobatório, o que, como cediço, é defeso em sede de habeas corpus.
4. O preceito secundário do crime pelo qual o paciente foi condenado (art. 311 do Código Penal) já estabelece a cumulação da pena de multa com a pena privativa de liberdade, de modo que se deve privilegiar na substituição a escolha da pena restritiva de direitos.
5. Agravo regimental não provido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO RIBEIRO DANTAS (RELATOR):
Em que pesem os esforços do agravante, o recurso não merece ser provido.
A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Assim, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e dos parâmetros concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, por exigirem revolvimento probatório.
Para permitir a análise dos critérios utilizados na dosimetria da pena, faz-se necessário expor excertos da sentença condenatória e do acórdão dos embargos de declaração, respectivamente:
"[...] 1ª Fase. Circunstâncias Judiciais. Examinando as circunstâncias judiciais capituladas no art. 59 do Código Penal para o crime imputado ao réu, verifico que a culpabilidade, entendida como o grau de reprovabilidade da conduta, não enseja majoração da pena, porquanto no caso em análise o delito não se revestiu de quaisquer elementos que indicassem sua maior reprovabilidade. O réu não possui antecedentes (fls. 44-45). A conduta social e a personalidade do réu não são conhecidas, pois não existem provas de como é sua postura no trabalho, na comunidade ou no seio da sua família. Também não há dados sólidos para examinar a sua personalidade, assim considerada como a síntese das suas qualidades sociais e morais. As consequências, as circunstâncias e os motivos do crime não fugiram da normalidade do tipo penal infringido, sendo que a vítima em nada contribuiu para consumação do delito.
Assim, ao fim da primeira etapa da dosimetria da pena, resta a pena-base fixada em: 3 anos de reclusão, mais 10 dias-multa. 2ª Fase. Atenuantes e Agravantes.
Na fase intermediária da pena, presente a atenuante da confissão espontânea (art. 65, III, "d", CP), que, todavia, não será computada, uma vez que o seu reconhecimento não pode conduzir à redução da pena abaixo do quantum abstratamente fixado em lei, nos termos da Súmula n. 231, do Superior Tribunal de Justiça.
Assim, ao final da segunda fase da dosimetria da pena, resta a reprimenda estabelecida provisoriamente em: 3 anos de reclusão, mais 10 dias-multa. Insta destacar que os dias-multa não são influenciados pelas modificações ocorridas durante a segunda fase da dosimetria, porquanto obedecem para sua fixação o critério bifásico. 3ª Fase. Causas Especiais de Diminuição ou Aumento de Pena.
Na etapa derradeira da fixação da pena, não existem causas especiais de diminuição ou aumento da pena, conforme fundamentado oralmente na sentença, de modo que deve permanecer a pena no quantum fixado anteriormente. Nessa medida, ao fim da dosimetria, resta a pena fixada em: 3 anos de reclusão, mais 10 dias-multa. Disposições Gerais Aplicáveis à Dosimetria. Em razão do quantum fixado, o regime inicial de cumprimento da pena é o aberto (art. 33, § 2º, "c", § 3º, do Código Penal). Ainda à luz do quantum penal, porque o acusado não é reincidente e as circunstâncias judiciais lhe são favoráveis, substituo a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade pelo prazo da condenação (art. 55 do Código Penal), à razão de 1 hora de tarefa por dia (art. 46, § 3º, do Código Penal) e prestação pecuniária no importe de 2 (dois) salários mínimos, ficando, pela substituição de pena, prejudicada a concessão de sursis (art. 77, III, do Código Penal)." (e-STJ, fls. 249-250).
"[...] Cumpre dizer que, no que concerne à escolha entre as alternativas previstas para a substituição da pena corporal, reverbera-se o entendimento de que, "existindo duas possibilidades de sanções substitutivas e não havendo o legislador definido os critérios a serem adotados na escolha, compete ao magistrado realizar a opção no exercício do seu juízo discricionário, que não dispensa a devida fundamentação de modo individualizado nas circunstâncias do fato e do processo, em obséquio ao princípio do livre convencimento motivado e ao mandamento constitucional inserto no artigo 93, inciso IX, da Carta da República" (STJ, REsp n. 1.546.553/SP, rela. Mina. Maria Thereza de Assis Moura, j. em 1º/10/2015).
Nesse passo, a escolha não se submete à preferência do embargante e não é devida a modi?cação, porquanto adequada ao caso dos autos, bem como escolhida pelo Juízo a quo no uso de seu poder discricionário. (e-STJ, fl. 410).
Quanto à pena substitutiva aplicada ao paciente, o art. 44, § 2º, segunda parte, do Código Penal prevê a possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade, nas condenações superiores a 1 ano, por duas restritivas de direitos ou por uma restritiva de direitos e multa, cabendo ao Magistrado processante, de forma motivada, eleger qual medida é mais adequada ao caso concreto.
Salvo se evidenciada manifesta desproporcionalidade, o que não se infere na hipótese ora analisada, deve ser mantida a pena restritiva de direitos imposta ao réu. Além disso, maiores incursões sobre o tema exigiriam revolvimento detido do conjunto fático-comprobatório, o que, como cediço, é defeso em sede de habeas corpus.
Outrossim, o preceito secundário do crime pelo qual o paciente foi condenado (art. 311 do Código Penal) já estabelece a cumulação da pena de multa com a pena privativa de liberdade, de modo que se deve privilegiar na substituição a escolha da pena restritiva de direitos.
A corroborar este entendimento:
"DIREITO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. PEDIDO DE AUMENTO DO PERCENTUAL DE DIMINUIÇÃO PREVISTO PARA O TRÁFICO PRIVILEGIADO. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. QUANTIDADE E NATUREZA DAS DROGAS APREENDIDAS. PROPORCIONALIDADE. INTENSIDADE DA TRAFICÂNCIA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. SÚMULA 171 DO STJ. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DE OPTAR . AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I - É assente nesta Corte Superior de Justiça que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos.
II - Com efeito, para a fixação do percentual de redução previsto no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, o magistrado deve levar em consideração as circunstâncias do caso, especialmente a natureza e a quantidade das drogas apreendidas, bem como as demais circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, ante a ausência de indicação das balizas pelo legislador para a definição do quantum de diminuição.
III - In casu, as instâncias ordinárias estabeleceram a fração de 1/4 (um quarto) para causa especial de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, aduzindo que a fração esta justificada, especialmente, em razão da natureza e da quantidade de droga apreendida ? 37,8 g de maconha e 17,5 g de cocaína -, elementos a revelar a intensidade da traficância. Assim, inexiste flagrante ilegalidade ou desproporcionalidade na fração escolhida a ensejar a concessão da ordem de ofício. Nesse sentido os seguintes julgados deste Tribunal Superior: HC n. 368.418/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 1º/2/2017; HC n. 354.058/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 25/11/2016; HC n. 394.803/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 28/6/2017.
IV ? Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Segundo a orientação jurisprudencial desta Corte de Justiça, "se ao tipo penal é cominada pena de multa cumulativa com a pena privativa de liberdade substituída, não se mostra socialmente recomendável a aplicação da multa substitutiva prevista no art. 44, § 2º, 2ª parte do Código Penal" (AgRg no HC n. 415.618/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 04/06/2018). No mesmo sentido, Súmula n. 171/STJ, segundo a qual, "Cominadas cumulativamente, em Lei Especial, penas privativa de liberdade e pecuniária, é defeso a substituição da prisão por multa".
V ? Ademais, observa-se nos autos que o v. acórdão impugnado se manteve adstrito ao quanto disposto no art. 44, § 2º, do Código Penal, o qual consigna ao arbítrio do julgador substituir a pena privativa de liberdade por multa e pena restritiva de direitos ou por duas restritivas de direito. A propósito: AgRg no HC n. 462.531/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 03/05/2019; e HC n. 482.389/SC, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe de 13/02/2019. Por fim, "nos termos da jurisprudência consolidada por esta Corte Superior, não existe direito subjetivo do réu em optar, na substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, se prefere a duas penas restritivas de direito ou uma restritiva de direitos e uma multa" (AgRg no HC n. 456.224/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 01/04/2019).
Agravo regimental desprovido.? (AgRg no HC 645.575/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 13/04/2021, DJe 19/04/2021, grifou-se);
?HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO. CRITÉRIO ATENDIDO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.
2. Tratando-se de condenação que excede 1 ano de reclusão e preenchidos os requisitos para a substituição da pena, ela se dá por uma medida restritiva de direitos e multa, ou por duas restritivas de direitos, incumbindo a escolha do benefício ao órgão prolator da decisão, no exercício de sua discricionariedade vinculada, considerando as particularidades do caso concreto e as subjetivas do agente. Precedentes.
3. Hipótese em que a Corte local motivou suficientemente a aplicação de duas restritivas, ao invés de uma restritiva e multa, em virtude de serem tais medidas mais adequadas às circunstâncias pessoais do paciente.
4. Ademais, não se mostra socialmente recomendável a aplicação de uma nova pena de multa, em caráter substitutivo, no caso de o preceito secundário do tipo penal possuir previsão de multa cumulada com a pena privativa de liberdade, devendo-se privilegiar a incidência de duas medidas restritivas de direitos nessa hipótese.
Precedente.
4. Habeas corpus não conhecido." (HC 470.920/SC, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 4/10/2018, DJe 15/10/2018, grifou-se);
Nesse contexto, não se constata qualquer ilegalidade a ser sanada, de ofício, no ponto.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É o voto.