Inteiro teor - REsp 1189206

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RECURSO ESPECIAL Nº 1.189.206 - PR (2010/0062277-3) RECORRENTE : ALL AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA DO BRASIL S/A E OUTRO ADVOGADO : HENRIQUE GAEDE E OUTRO(S) RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL RELATÓRIO A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: Cuida-se de recurso especial interposto com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª. Região assim ementado: TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. CIDE-COMBUSTÍVEIS. LEI Nº 10.336/01, ART. 2º. SUJEITO PASSIVO (EC 33/01). ART. 166 DO CTN. TRIBUTO DIREITO. INAPLICABILIDADE. 1. Hipótese em que a sentença extinguiu o feito, sem resolução de mérito, por carência de ação. Fundamento da ilegitimidade ativa para pleitear compensação da CIDE-combustíveis. 2. A Lei nº 10.336/01 criou a contribuição de intervenção no domínio econômico incidente sobre a importação e comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool etílico combustível, ou seja, a denominada CIDE sobre o petróleo. No seu art. 2º estabelece como contribuintes da Cide o produtor, o formulador e o importador, pessoa física ou jurídica, dos combustíveis líquidos relacionados no art. 3o, rol no qual não se enquadram as impetrantes, meras consumidoras finais. 3. Inaplicabilidade do art. 166 do CTN, porquanto ausente o fenômeno da repercussão, uma vez suportada em definitivo tão-somente por aqueles contribuintes citados na lei, sem que se cogite a transferência do encargo, do ponto de vista jurídico, a outrem. Inexistente previsão legal de destaque na nota fiscal, trata-se de incidência econômica (e não jurídica), a qual não dá ensejo à pretendida compensação. 4. Apelo desprovido.(f. 381) Opostos embargos de declaração (fls. 404/407), que foram providos para efeito de prequestionamento dos arts. 5º e 7º da Lei 10.336/2001 e 2º da Lei 8.078/90. (fls. 410/412) Nas razões de recurso, alega-se violação aos arts. 166 do CTN; 5º e 7º da Lei 10.336/2001 e 2º da Lei 8.078/90, sustentando, em suma, que: a) são contribuintes da CIDE - combustíveis como consumidoras finais, na qualidade de contribuintes de fato, que suportam o ônus tributário nas operações com combustíveis que praticam, pois o tributo encontra-se embutido no preço da referida operação, assistindo-lhes legitimidade ativa para postular a compensação das quantias indevidamente recolhidas; b) por determinação do art. 5º da Lei 10.336/2001, a CIDE-combustíveis incide sobre o metro cúbico do combustível, de forma que na prática o valor da contribuição seja incluído no preço da mercadoria vendida; c) tanto no ICMS como na CIDE - combustíveis não há menção expressa de que a incidência tributária se dará na figura do adquirente de mercadorias, mas há autorização para que os contribuintes da CIDE compensem o valor da contribuição paga na entrada das mercadorias com o valor devido nas operações de saída, nos termos do art. 7º da Lei 10.336/2001, que criou um sistema de não-cumulatividade para a referida contribuição de intervenção no domínio econômico; d) a CIDE - combustíveis foi instituída com a nítida intenção de substituir a Parcela de Preço Específico - PPE, que também integrava o preço final das operações com combustíveis no mercado interno, de modo que idêntico o seu regramento legal; e e) o Tribunal Regional Federal da 5ª. Região, na AMS 2002.83.00.013629-0, reconheceu a legitimidade ativa do contribuinte de fato - consumidor final na operação de aquisição de combustíveis - diversamente do que entendeu o aresto recorrido proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª. Região. Ao final, postula a reforma do aresto recorrido para que os autos retornem ao TRF da 4ª. Região para apreciação das questões meritórias. (fls. 415/441) Contrarrazões às fls. 472/489, defendendo a ilegitimidade ativa dos consumidores de combustíveis para postular a ilegalidade/compensação da contribuição incidente sobre estas operações. Inicialmente inadmitido (f. 491), subiram os autos por força do provimento de agravo de instrumento (f. 545). É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.189.206 - PR (2010/0062277-3) RELATORA : MINISTRA ELIANA CALMON RECORRENTE : ALL AMÉRICA LATINA LOGÍSTICA DO BRASIL S/A E OUTRO ADVOGADO : HENRIQUE GAEDE E OUTRO(S) RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL VOTO A EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (Relatora): O Tribunal Regional Federal da 4ª. Região manteve sentença, que extinguiu mandado de segurança sob fundamento da ilegitimidade ativa da impetrante, entendendo que: 1) a Corte, por precedente da 1ª Turma, já se manifestou favoravelmente à legalidade da CIDE - combustíveis prevista na Lei 10.336/2001; 2) consoante o art. 2º da Lei 10.336/2001 as apelantes, ora recorrentes, não se incluem dentre os contribuintes do tributo, ostentando a condição de consumidoras finais; 3) o art. 166 do CTN direciona-se aos tributos, que comportem repercussão jurídica do encargo econômico e não repercussão meramente econômica do tributo, fenômeno comum na órbita tributária, ou seja, somente àqueles em que a própria lei estabelece a transferência do encargo financeiro a um contribuinte dito de direito em detrimento do contribuinte de fato, perfeitamente identificado na relação jurídica tributária; 4) a CIDE - combustíveis é um tributo direto, porque ausente o fenômeno da repercussão, uma vez suportada em definitivo tão-somente por aqueles contribuintes citados na lei, sem que se cogite a transferência do encargo, do ponto de vista jurídico, a outrem; e 5) a jurisprudência do TRF da 4ª. Região, analisando a legitimidade ativa dos consumidores de combustíveis quanto à Parcela de Preço Específica - PPE, já lhes reconhecia a ilegitimidade ativa ad causam. Da transcrição dos fundamentos do aresto recorrido, observa-se que os arts. 5º e 7º da Lei 10.336/2001 e art. 2º da Lei 8.078/90 - Código do Consumidor não foram prequestionados na origem, a despeito da oposição de embargos de declaração e da manifestação da Corte Regional no julgamento dos embargos de declaração, afirmando a inexistência de contrariedade ou negativa de vigência aos aludidos enunciados normativos, em razão de serem totalmente irrelevantes para o deslinde da controvérsia. Incide, na espécie, a Súmula 211/STJ. O acórdão recorrido apresentou fundamento suficiente para, confirmando a sentença de extinção do mandado de segurança por ilegitimidade passiva, rechaçar a pretensão contida no apelo das recorrentes sob fundamento de que o contribuinte de fato é parte ilegítima (arts. 3º e 267, IV do CPC) para postular a devolução de tributo direto (CIDE - combustíveis), sendo inaplicável o art. 166 do CTN, de restrito alcance aos tributos, que por sua natureza, comportem repercussão jurídica do encargo econômico. Desta forma, restou não impugnado fundamento suficiente do aresto recorrido - ilegitimidade ativa e extinção do feito sem julgamento de mérito por carência de ação -, o que atrai a incidência, por analogia, da Súmula 283/STF. Nesse sentido: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PARCELA DE PREÇO ESPECÍFICA - PPE. PETRÓLEO E DERIVADOS. LEGITIMIDADE ATIVA. TRANSFERÊNCIA DE ENCARGO FINANCEIRO. ART. 166 DO CTN. FUNDAMENTO INATACADO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 283/STF. ADEMAIS, AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 282/STF. I - Diz a recorrente que o PPE tem característica de tributo e, por isso mesmo, tendo suportado o ônus de seu pagamento, detém a legitimidade ativa ad causam. Todavia, inexiste interesse em recorrer, no ponto, tendo em vista que o acórdão hostilizado reconhece o PPE como tributo. II - O verdadeiro fundamento, constante do julgado, para fins de se concluir pela dita ilegitimidade ativa não foi atacado, qual seja, o de que não se aplica o art. 166 do Código Tributário Nacional, na hipótese, "porque os tributos que comportam, por sua natureza, transferência do encargo financeiro são somente aqueles em relação aos quais a própria lei estabeleça a transferência". Incidência da Súmula n. 283/STF. III - Ademais, os dispositivos infraconstitucionais indicados não foram objeto de julgamento no âmbito do Tribunal Regional, carecendo o recurso especial do pressuposto específico do prequestionamento (Súmula n. 282/STF). IV - Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 909.341/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/08/2007, DJ 17/09/2007 p. 220) Destaco do voto-vista do Min. Teori Albino Zavascki, que a parte intentou o recurso especial tão-somente alegando a violação do art. 267, IV do CPC, sem impugnar também o art. 166 do CTN, como se lê no seguinte trecho: 2. O recurso especial não pode ser conhecido no que diz respeito à legitimidade. É que o acórdão recorrido, ao afirmar a ilegitimidade ativa, asseverou que (a) a impetrante "não possui a condição de contribuinte, porquanto o normativo ministerial não atribuiu a obrigação de recolher a PPE às distribuidoras e, de igual forma, não pode ser considerada como responsável tributária, uma vez que inexiste previsão legal atribuindo-lhe qualquer obrigação" (fl. 566) e (b) "não há falar na ocorrência de transferência do encargo financeiro e, conseqüentemente, na aplicação do artigo 166 do Código Tributário Nacional, porque os tributos que comportam, por sua natureza, transferência do encargo financeiro são somente aqueles em relação aos quais a própria lei estabeleça dita transferência." sendo que as "Portarias Interministeriais são normas infralegais e não se equiparam à lei" (fl. 566). A recorrente, por sua vez, nas razões do recurso especial, alega, essencialmente, que tendo "experimentado um empobrecimento imediato ao ser-lhe retirado valores do seu patrimônio no exercício da sua atividade empresarial, através da cobrança da PPE, repassando-se os ao erário, iniludivelmente é parte legitimada, (...) restando errônea e equivocada a extinção do feito, singularmente, por ausência de uma das condições da ação" (fl. 589). Bem se vê, portanto, que o recurso não impugnou o segundo argumento (item b acima) do acórdão recorrido que, bem ou mal, constitui fundamento autônomo e suficiente à manutenção do aresto. Aplica-se ao caso, por analogia, a Súmula 283 do STF, que dispõe ser "inadmissível o recurso extraordinário quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles". Assim, onde há a mesma razão deve-se aplicar a mesma solução jurídica. Em razão da impossibilidade de conhecimento do recurso especial, prejudicada a divergência jurisprudencial apontada. Com essas considerações, não conheço do recurso especial. É o voto.